“Litoralgarve” foi espreitar os trabalhos do carnaval de Odiáxere

Carnaval de Odiáxere presta homenagem ao cinema e História de Portugal com bonecos vindos de Torres Vedras e espera atrair mais de 10.000 visitantes

“O Carnaval não se explica, sente-se. E é difícil explicar isto às pessoas que nunca participaram” – Tânia Bandarra

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“Nós, Clube Desportivo de Odiáxere, estamos a trabalhar com nove carros. Irá também participar a Santa Casa da Misericórdia de Lagos, com utentes de um lar num carro, além de um infantário de Odiáxere, o Grupo de Amigos do Chinicato e mais três ou quatro famílias igualmente de Odiáxere. Desconhecemos o conteúdo de carro particular, pois é surpresa e cima da hora.” – Sofia Santos

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“Estamos sempre atentos à segurança e eu sou um simples ajudante” – José Amores

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“O carro com mais flores deve levar sete ou ou oito mil. E´ um trabalho de muitas horas, que obriga a muita paciência, direcionado  às senhoras que prestam apoio à organização.” – Filipe

Beatriz Costa e Vasco Santana, este junto ao célebre candeeiro do famoso filme ‘A Canção de Lisboa’; ‘Alice no País das Maravilhas’; o Infante Dom Henrique, histórico navegador português na epopeia dos Descobrimentos Marítimos com a partida das caravelas de Lagos; duas grandes garrafas, uma simbolizando o vinho tinto e outra dourada, acompanhadas de um cacho de uvas; uma sátira televisiva com a TVI, a RTP, a SIC e a CMTV; o surfista McNamara nas gigantescas ondas da Nazaré; e a famosa Padeira de Aljubarrota.

São essas algumas das principais figuras exibidas em magnificos bonecos que integrarão o desfile dos carros alegóricos na 26ª. edição do Carnaval de Odiáxere, com tema livre, na terça-feira de Entrudo, dia 25 de Fevereiro, das 15h00 às 19.00 horas, no local habitual, entre a zona junto ao moinho e a estrada de acesso à barragem daquela localidade do concelho de Lagos. O preço de entrada no recinto é um euro e meio por pessoa. Carrinhas e tratores, cedidos por um empresário e amigos residentes em Odiáxere, funcionarão como viaturas de apoio.

O Carnaval de Odiáxere tem um seguro que cobrirá eventuais prejuízos e acidentes, desde a saída das viaturas do armazém da organização, desfile no recinto e regresso ao local de partida.

A má memória da chuva que,  em 2019,  adiou o desfile para o domingo a  seguir  ao  Entrudo   

O ‘Litoralgarve’ foi assistir, durante uma noite, a preparativos num antigo e amplo armazém que pertencia à Solmate, fábrica de materiais de construção civil já desativada perto de Lagos, cedido pela Caixa de Crédito Agrícola ao Clube Desportivo de Odiáxere, que organiza o evento. “Se não tivéssemos este armazém, não seria possível fazer o Carnaval desta forma. É o terceiro ano consecutivo que estamos aqui. Antes, estivemos durante dois anos consecutivos num outro armazém localizado no sítio da Torre, também pertencente à Caixa de Crédito Agrícola”, nota a presidente da Direção do Clube Desportivo de Odiáxere, Sofia Santos.

Atenta a todos pormenores, enquanto outros colegas se dedicam a trabalhos na montagem dos carros, aquela responsável deixa, desde logo, um desejo, em jeito de recado ao São Pedro, o mítico deus da chuva: “Só espero que o Carnaval de 2020 seja melhor do que foi em 2019”, quando a chuva impediu o desfile dos carros alegóricos. “Não foi o que pretendíamos, devido ao fator do tempo. Depois, optámos por fazer o desfile no domingo seguinte, altura em que também tivemos alguma boa aceitação por parte das pessoas. Não foi o desejado, mas foi positivo”, recorda Sofia Santos, parecendo ainda mal refeita das contrariedades que acabaram, então, por surpreender os festejos carnavalescos no ano passado.

“Nós, Clube Desportivo de Odiáxere, estamos a trabalhar com nove carros” – revela Sofia Santos, acrescentando: “Irá, também, participar a Santa Casa da Misericórdia de Lagos, com utentes de um lar num carro, além de um infantário de Odiáxere, o Grupo de  Amigos do Chinicato, com um carro, e mais três ou quatro famílias igualmente de Odiáxere. Desconhecemos, no entanto, o conteúdo de cada carro particular, pois é surpresa em cima da hora.”

Sofia Santos – Presidente da Direção do Clube Desportivo de Odiáxere

“Os nossos temas estão sempre dependentes dos bonecos que possamos trazer de Torres Vedras, devido à parceria”

A geminação, ocorrida em Julho de 2009, entre os municípios de Lagos e de Torres Vedras, permite ao Carnaval de Odiáxere apresentar, em cada ano, famosos bonecos oriundos daquela cidade, com os dirigentes do clube algarvio a darem, depois, largas à sua imaginação e criatividade. À partida, é tudo uma incógnita. “Os nossos temas estão sempre dependentes daquilo que possamos trazer de Torres Vedras, devido à parceria. De resto, estamos muito gratos pelo trabalho que nos têm feito em relação aos bonecos. Neste ano, conseguimos figuras que ainda não tínhamos trazido. São, basicamente, figuras que eles, em Torres Vedras, apresentaram no Carnaval de 2019, cujo tema foi «Made in Portugal», ou seja produto português. Como tal, há uma mensagem com vinho representado por duas garrafas, uma das quais perto de cinco metros, «McNamara», o surfista da Nazaré, e azeite simbolizado através de uma garrafa. Temos uma figura que significa a artista Joana Vasconcelos, que, no entanto, ainda não sabemos se vamos utilizar. Há uma televisão, numa alusão aos canais TVI e SIC, um boneco representando um repórter da CMTV, que está como Drácula, e outro da RTP, o qual também vai ser aplicado num dos carros. E temos uma caravana com figuras de um rei de Portugal e da padeira de Aljubarrota. O público poderá, ainda, apreciar um carro a representar a ‘Alice no País das Maravilhas’ e outro também para crianças”, conta Sofia Santos, que perspetiva atrair mais de dez mil visitantes para assistir ao corso carnavalesco. “Espero mais gente do que no ano passado. Tenho de esperar!”, aponta, com convicção.

Empresa de Lisboa garante animação para as crianças, com andarilhos,  circo ambulante,  pinturas  faciais  e  enchimento   de  balões

 No dia 23 de Fevereiro, domingo, o Carnaval de Odiáxere é dedicado, sobretudo, aos mais pequenos. “Temos animação infantil a partir das 14h.30m. até às 20h00, com uma empresa xpto, sediada perto de Lisboa, que atuará com andarilhos, depois faz um espetáculo tipo circo ambulante para os mais pequenos e contamos também com pinturas faciais e enchimento de balões, entre outras diversões. E como convidado para esse dia temos o «Palhaço Companhia»”, diz-nos aquela dirigente do Clube Desportivo de Odiáxere.

“Já temos um público fixo, digamos assim, na área do barlavento algarvio. E neste ano, na terça-feira de Carnaval contamos como artista principal o ator Pedro Barroso. Acho que haverá uma boa aceitação da parte das pessoas que nos irão visitar”, adianta, confiante.

O transporte das figuras cedidas pela Câmara Municipal de Torres Vedras, foi efetuado na altura própria, em Janeiro, após conhecimento do material existente naquela cidade. “O Clube Desportivo de Odiáxere entrou em contacto com uma transportadora que se deslocou a Torres Vedras para trazer o material. Antes, porém, fomos ver os bonecos e o que lá havia. Só depois é que foi feito o transporte para cá, tendo sido assegurado por seis homens num camião”, lembra Sofia Santos.

E se não fosse o protocolo de Lagos com o município de Torres Vedras, como seria, afinal, hoje, o Carnaval de Odiáxere? Após breve pausa, aquela responsável responde: “Não era difícil, nem fácil, seria diferente. Acho que estas figuras trazem outra beleza ao Carnaval de Odiáxere. Caso contrário, teríamos de trabalhar noutros moldes. Também temos dois carros que não levarão peças de Torres Vedras.”

Dois  grupos  com  um  total de  vinte  pessoas  trabalham  diariamente  desde  o início de  Janeiro  no  armazém  da  organização

No armazém onde são passadas diariamente cerca de oito horas de trabalho, muitas das quais quase em silêncio e com total concentração, Sofia Santos explica à reportagem do ‘Litoralgarve’: “Começámos a trabalhar no início de Janeiro. Temos dois grupos, um com três, quatro, cinco pessoas, depende, porque também têm os seus empregos, e vêm das 15h00 até às 20h00, mais ou menos. Essas pessoas cortam o papel, fazem flores, entretanto surgem ideias, as quais partilhamos e aplicamos nos carros. O segundo grupo encontra-se aqui das 21h00 até à meia-noite e conta com homens que fazem os suportes para que possamos colocar as peças em cima dos carros e os platexes para pôr as flores. Embora seja utilizado, como é lógico, algum material usado em 2019, basicamente é tudo limpo do ano passado para este ano. Temos de fazer sempre todos os carros, exceto dois em cuja estrutura praticamente não mexemos, pelo que os vamos reaproveitar.”

José Amores – Preparação de Mais um carro carnavalesco

No total, trabalham na confeção dos carros e das figuras cerca de duas dezenas de elementos. “São mais” do que em 2019. “Neste ano, houve uma boa aceitação ao nosso pedido, as pessoas ficaram sensibilizadas”, congratula-se Sofia Santos. Reconhece que “é difícil” cativar as pessoas, “tanto para participarem no Carnaval, como para ajudar.” E procura encontrar justificações para tal: “Acho que as pessoas não têm este espírito carnavalesco incutido. E desde crianças, também nunca ou raramente participaram no Carnaval. Quem quer fazer isto, tem de ter mesmo espírito de sacrifício.” “Isso, mesmo com tanta conversa que, por vezes, tenhamos com as pessoas e reuniões que houve, além do facto de tentarmos fazer com que alguns pais dos atletas do Clube Desportivo de Odiáxere pudessem participar e nos ajudar. E foi essa aceitação que tivemos”, adianta.

Com 44 anos e rececionista em Lagos, Sofia Santos é casada e tem quatro filhos. “A minha família participa, os meus filhos mais pequenos, os outros não, mas dão-me um apoio muito grande. Se não tivesse os filhos e o marido que tenho, jamais poderia estar a fazer a vida que faço”, enaltece.

Receitas  do  Carnaval  suportamas  despesas  do Clube Desportivo  de Odiáxere, ou  “pelo menos  consegue-se  aliviar   um  pouco  as  costas” 

Convencer os mais jovens quando, nos dias de hoje, existem tantas formas de ocupar o tempo, nomeadamente com a Internet, redes sociais, “é difícil”. “Por isso, nós, clube, estamos a tentar incutir isto nas crianças para que o Carnaval não se perca. E para que as mães também possam ver que o Carnaval é importante não só para a animação, mas também para termos algum fundo de maneio com vista a suportarmos algumas despesas do clube”, afirma a presidente da Direção. É que, em termos de receitas, com Carnaval “pelo menos consegue-se aliviar um pouco as costas…”

Custos  com  material  e artistas   ascendem  a  34 mil  euros

A totalidade dos custos do Carnaval de Odiáxere 2020, desde madeiras, esponjas e tintas, até colas e papel, entre outros outros materiais, além dos artistas contratados, ascende a 34 mil euros. Neste armazém onde estão a ser preparados carros e figuras que irão participar no desfile, o clube despende “provavelmente, talvez uns 20 mil euros.”

“Toda a madeira é comprada na empresa Madilagos. Só em madeira, poderemos gastar cerca de mil euros. Depois, temos esponja, contando para tal com a oferta de um patrocinador, a que se juntam outros materiais. As flores são em papel, que, tal como a cola, compramos a uma empresa de São Bartolomeu de Messines, no concelho de Silves”, especifica Sofia Santos, recordando-se de alguns pormenores.

Tantos dias e horas de trabalho, esforço e dinheiro investido poderão não ser compensados se no dia do corso, terça-feira de Entrudo, 25 de Fevereiro, chover. Tal situação, recorde-se, obrigou em 2019 a adiar para o domingo seguinte os festejos. E, afinal, qual é o plano B, alternativo para este ano? A presidente da Direção do clube, espera que, desta vez, tudo decorra da melhor forma, mas tem um plano em mente:  “No domingo será o desfile das crianças, como já disse, e na terça-feira, o nosso, o vigésimo sexto. Se alguma coisa acontecer… pois teremos de passar para o fim-de-semana seguinte.”

Movimento  no  comércio  e na  restauração

O Carnaval de Odiáxere permitirá muita animação na própria localidade. Sofia Santos não tem dúvidas, mas ressalva: “O comércio irá ter, como é natural, muito mais movimento do que aquele que tem tido. Mesmo assim, se calhar, infelizmente, não será o desejado. Também alguns estabelecimentos estão fechados, nomeadamente mercearias ou mini-mercados, e a praça. Temos alguns cafés, mas também não é por ir além. E no recinto onde decorrerá o desfile, também não existe muito comércio.”  De qualquer modo, perspetiva movimento ao nível comercial e da restauração.

Escolta   da  GNR  por  caminhos  secundários

A deslocação dos carros alegóricos em preparação neste antigo armazém, situado numa zona entre o Sargaçal e Odiáxere, para o recinto do desfile nesta localidade, contará, como habitualmente, com a ajuda da Guarda Nacional Republicana (GNR) de Lagos. “Os carros que aqui estão saem deste armazém todos ao mesmo tempo e existe uma escolta da GNR a acompanhá-los, através de caminhos secundários, aqui por detrás, não pela Estrada Nacional 125, diretamente para a rua do desfile em Odiáxere, num total de, talvez, uns cinco ou seis quilómetros”, detalha Sofia Santos. “Já o desfile decorrerá num total de cerca de dois quilómetros, na Estrada da Barragem, junto ao moinho, passando pela Rua da Alegria”, acrescenta.

Perspetiva-se, também, muita animação nas noites em Odiáxere durante a quadra carnavalesca, com artistas, música e bailes na sede do Clube Desportivo, junto ao campo de futebol. A 23 de Fevereiro (domingo), entrará em cena Emanuel Martins, a 24 (segunda-feira) será a vez de Cláudio Rosário, Marco Filipe e Iran Costa, e para a despedida, na noite de 25 (terça-feira), Entrudo, estará no palco Humberto Silva, presença habitual para abrilhantar estas festividades.

Quando em  criança ia mascarada aos  desfiles  de  Carnaval  com  a  mãe 

Entre recordações, com os olhos a brilhar e natural saudade à mistura, Sofia Santos lembra-se de “ir aos desfiles de Carnaval com a minha mãe” quando era criança. “Mascarada, fui, não muito, porque não era muito adepta”, diz, embora “não me recorde sinceramente” das máscaras e trajes que usava. “Depois, participei durante alguns anos no Carnaval do Clube Desportivo de Odiáxere, ajudei, também, a produzir alguns carros quando antigamente cada pessoa fazia o seu carro na sua garagem ou no  seu armazém. Também sempre participei”. A partir de então, começou a ganhar o tal ‘bichinho’ pelo Carnaval. “Sim, porque gosto de realizar eventos. E há onze anos, participo na organização  do Carnaval de Odiáxere e confeção dos carros alegóricos. No final de cada noite no armazém, sinto-me cansada, mas o cansaço vale a pena ao ver-se as coisas tornarem-se realidade”, vinca.

“Nunca  ouvi  uma  frase  menos  positiva pelo  trabalho  que desenvolvemos”

No dia do desfile, há sempre aspetos a melhorar, numa altura em que, na rua, ouve os comentários do público. “Acho que as pessoas têm ficado satisfeitas. Nunca ouvi uma frase menos positiva pelo trabalho que desenvolvemos. Julgo que as pessoas reconhecem. Se não reconhecem, isso não me diz respeito, porque se as pessoas não fizerem, não sabem o trabalho que isto dá”, sublinha Sofia Santos.

Já no momento em que vê os carros alegóricos na rua, confessa “não ter tempo” para os admirar e debruçar-se sobre aspetos a ter em conta. “Quando os carros estão a desfilar, estou a fazer outras coisas”. De qualquer forma, admite, “poderíamos melhorar algo mais, mas o tempo não nos permite e somos poucos.” “Com mais gente disponível para trabalhar, poderíamos melhorar, termos os carros talvez de outra forma, mas isso também faria com o que o investimento fosse ainda maior e nós não temos capacidade para tal. Logicamente que poderíamos aplicar outras técnicas, mas, para já, não nos é possível”, frisa.

“Temos  de  ter  pessoas  especializadas  para  fazer estes  trabalhos  e  mais  20  ou  30  mil  euros  para  o  Carnaval  de  Odiáxere  evoluir”

Esta responsável da organização do Carnaval de Odiáxere, aproveita para lançar um desafio: “Temos de ter pessoas, digamos, certificadas, especializadas para fazer estes trabalhos, porque existem muitas técnicas que não sabemos e temos evoluído muito pouco.” “Não temos nem máquinas, nem pessoas que nos possam ajudar. Há coisas que vamos vendo e aprendendo connosco próprios”, sublinha Sofia Santos. “Teríamos de ter um investimento se calhar de mais 20 mil euros ou 30 mil, porque para fazer estes bonecos é necessário muito dinheiro. Por outro lado, teríamos de contar, talvez, com mais cinco ou seis pessoas, mas mesmo especializadas nesta matéria”, reforça.

“Isto  é  um  grupo  de  boa  vontade que   vem  aqui  todos  os  dias”

Sensivelmente a meio do armazém de apoio ao Carnaval de Odiáxere, José Amores, de 72 anos, trabalha com madeiras. “Estamos a fazer os fundos dos reboques para colocar as figuras por cima. Tem de ficar tudo bem firme, seguro. E tem de haver criatividade para isto tudo”, conta, animado, ao ‘Litoralgarve’.

“Trabalho de boa vontade, sou mais um que estou a ajudar. A minha técnica é a ajuda. De resto, o Carnaval do Odiáxere é muito à base da boa vontade dos participantes”, constata. De outra maneira, lamenta, “coletividades, associações, é tudo muito complicado. Todos nós sabemos disso. E aqui o Carnaval e o Clube Desportivo de Odiáxere não fogem a isso.” “Temos aqui algumas pessoas, isto é um grupo de boa vontade, que vem todos os dias. Também há muitas senhoras que vêm fazer flores em papel”, conta.

José Amores destaca “a boa vontade também de algumas pessoas que emprestam os reboques e outro tipo de viaturas.” Mas o Clube Desportivo de Odiáxere tem aqui dois carros próprios.

José Amores

“Loulé  é  Loulé.  É  centenário.  E  o  Carnaval  de  Odiáxere vai  caminhando  para  os  50  anos.  Para  já,  são  26 ..”

Os elogios estendem-se à parceria com a Câmara Municipal de Torres Vedras, que “é boa”, além do apoio da Junta de Freguesia de Odiáxere. “Tem havido um bom relacionamento com a Junta de Freguesia. E os agradecimentos alargam-se à Câmara Municipal de Torres Vedras. Mas isto, no final, não fica nada barato. Há despesas de transporte, é preciso ir buscar e levar as figuras. Como a Câmara de Torres Vedras está disposta a colaborar, através do seu Carnaval, com o de Odiáxere, acho que este é o melhor Carnaval aqui das redondezas”, considera José Amores.

Já em relação ao Carnaval de Loulé, recusa estabelecer  comparações: “Loulé é Loulé. É centenário. E o Carnaval de Odiáxere vai caminhando para os 50 anos, o que já não é mau. Para já, são 26 anos…”

“A  segurança  está  em  primeiro  lugar”

 Ao olhar para a estrutura de um carro que vai trabalhando, José Amores aponta para as paletes de madeira e diz: “a segurança é o ponto número um. Brincar ao Carnaval é um dia. A segurança está em primeiro lugar. Um trator, uma viatura diferente, uma camioneta, ou outra coisa qualquer que seja, com um motor a andar à volta onde está muita gente… tem de haver o máximo de segurança, o máximo de respeito pelas pessoas que ali estão. E a segurança parte de quem organiza o Carnaval, parte das viaturas que vamos lá ter. Não são novas, mas estão num estado em que podem andar no local sem o mínimo de problemas.”

Sobre o dia do desfile, José Amores indica qual o seu papel: “será ajudar naquilo que faz falta e principalmente no dia de Carnaval –  tem-me calhado isso há alguns anos – de manhã, é preciso fechar as ruas, com portões próprios, vamos buscar o material e organizar tudo da melhor maneira. Depois, durante o desfile, ajudo, com outros, naquilo que é necessário. Estamos sempre atentos à segurança e eu sou um simples ajudante do Carnaval de Odiáxere.”

“Muitas  vezes,  as  pessoas  só  querem  uma  coisa:  na  altura que  dê  nas  vistas,  aparecer  e o  resto  é   cantigas”

Nos seus tempos de criança, José Amores brincava ao Carnaval em vários locais. “Odiáxere sempre foi voltado ao Carnaval, embora aquilo fosse umas cegadas nos anos em que eu era mais jovem. Depois, apareceu o Carnaval em Lagos, que, com pena se calhar de muita gente, não devia ter acabado como acabou”, recorda. E continua: “Em Odiáxere, uma das principais pessoas para que o Carnaval arrancasse foi o Bandarra, o Luís, antigo presidente da Junta Freguesia e hoje vereador da Câmara Municipal de Lagos. Até dizem que ele é o pai do Carnaval de Odiáxere e não só. A partir de então, tem sido uns anos melhor, outros piores, com crises, pois isto não é brinquedo algum, não é fácil de fazer.” E em tom crítico, deixa recados: “Tem de haver boa vontade, tem de haver quem possa e queira ajudar. Muitas vezes, as pessoas só querem é uma coisa: na altura que dê nas vistas, aparecer e o resto e cantigas.”

José Amores só pede que esteja bom tempo no dia de Entrudo, “para não acontecer como no ano passado, em que tivemos de adiar o desfile dos carros para o domingo seguinte.” “Peço às pessoas para que apareçam, que venham ao Carnaval do Odiáxere, pois não irão ficar defraudadas. Já sabem como é. Não é rico, é um Carnaval mais modesto, mas dá para animar.” E reforça o seu apelo: “as pessoas que venham. O nosso Carnaval é genuíno, é tipo bairrista. É o que temos e aquilo que podemos fazer, mas vai ser bom, assim o São Pedro o permita…”

“Um  carro  leva,  em  média,  5.000  flores  em  papel”

Filipe, de 45 anos, membro da direção do Clube Desportivo de Odiáxere, é um dos responsáveis pela conceção e produção dos carros que integram o corso. Até lhe chamam o engenheiro do Carnaval. “Estou em tudo desde o início a começar pela deslocação a Torres Vedras para ir buscar os bonecos, ver quais são os que se estão a enquadrar com o nosso Carnaval, perante aquilo que temos delineado. E depois é começar a produzir isto todos os dias e todas as noites. Este é o quarto ano em que temos esta parceria com Torres Vedras”, descreve à nossa reportagem, entre uma pausa.

Depois da deslocação àquela cidade para ver os bonecos existentes, os elementos da organização do Carnaval de Odiáxere ficaram logo com a ideia daquilo que pretendiam. “Fomos ver os bonecos que eles tinham e passados três ou quatro dias regressámos a Torres Vedras para os ir buscar”, lembra Filipe.

“Temos de reaproveitar ao máximo todo o material utilizado noutros anos”, como por exemplo madeiras, “porque tudo custa muito dinheiro e nós temos de ‘fazer das tripas coração’ por vezes.” Não consegue apontar a quantidade de madeira utilizada, mas sabe que “um carro leva em média cerca de cinco mil flores” em papel para ornamentar. “Há carros que levam muito mais”, assinala Filipe, adiantando que “o carro com mais flores deve levar sete ou oito mil”. “É um trabalho de muitas horas, que obriga a muita paciência, direcionado às senhoras que prestam apoio à organização do Carnaval de Odiáxere. É um serviço mais leve e elas têm um pouco de mais paciência do que nós para a parte da colagem”, nota, sem rodeios.

Há carros surpresa no Chinicato e também em Odiáxere, que só surgirão no desfile. “Não fazemos ideia nenhuma sobre o que virá de lá. São todos bem-vindos e hão-de se enquadrar todos bem connosco. O nosso Carnaval acaba por ser uma coisa mais espontânea”, refere, com um sorriso, aquele elemento da organização.

“Com  120 mil  euros  já  conseguiríamos criar  o  nosso  Carnaval   baseado  à  volta  de um  tema”

Para “um bom Carnaval, necessitaríamos para aí de umas quatro vezes mais o valor que a Câmara Municipal de Lagos nos atribuiu, que é 30 mil euros. Ou seja, com 120 mil euros já conseguiríamos digamos, fazer uma coisa muito, muito engraçada. Já poderíamos criar o nosso Carnaval de uma forma diferente, baseada à volta de um tema. Assim, o tema é mais espontâneo, aquilo que cada um quiser apresentar, o que é bem-vindo, para tentar agradar aos foliões que vão ao desfile”, salienta aquele colaborador.

E será que com mais dinheiro, Odiáxere poderia fazer concorrência ao Carnaval de Loulé? – questionámos. “Temos de ter consciência que estamos uns anos atrás do de Loulé. Mas, quiçá…” – reage, lacónico, Filipe.

Recorda que o seu pai foi um dos impulsionadores do corso com carros alegóricos no Carnaval organizado, há anos, pelo Clube de Futebol Esperança de Lagos. “Infelizmente, quando ele deixou, aquilo acabou”, lamenta. “Logo em pequeno tive um contacto muito direto com o Carnaval. E há quatro anos, o Luís (Bandarra) desafiou-me um dia para ir ao armazém e pronto… reativou” em Odiáxere.

O  candeeiro  de  Vasco  Santana,  garrafões  e a guitarr na homenagem  ao  cinema  português

Noutra zona do armazém, o ‘Litoralgarve’ encontra Tânia Bandarra, bem disposta, junto a um carro já com algumas flores de papel coladas. “Na minha família já existe o espírito do Carnaval, mas foi de certa forma o meu primo, Luís Bandarra, que me trouxe a mim e ao meu marido para aqui, uma vez que também fazemos parte da direção Clube Desportivo de Odiáxere, e nos incutiu mais este ‘bichinho’ do Carnaval”, garante, com uma gargalhada à mistura.

“Estou a colar flores para fazer acabamentos do carro que vai representar o cinema português. Vamos acabando os pormenores. Neste carro teremos um boneco que é o Vasco Santana, o qual trouxemos de Torres Vedras, tal como outros bonecos”, explica. E após uma pausa, acrescenta: “o Vasco Santana vai trazer alguns objetos, como o emblemático candeeiro de um dos seus filmes, ‘A Canção de Lisboa’. Vamos ter, também, algumas fotografias da Beatriz Costa e do Vasco Santana, para, depois, os figurantes caracterizarem essas duas personagens no desfile. Teremos, ainda, os garrafões, a guitarra portuguesa do fado estudante e os manjericos na emblemática situação de ‘A Canção de Lisboa”, que a Beatriz Costa e o Vasco Santana representam. É esta a ideia.”

O papel utilizado para imitar as flores é encomendado todos os anos pelo Clube Desportivo de Odiáxere a um fornecedor do Algarve. “Depois, vamos cortando os moldes e fazendo as flores das cores de acordo com o que vamos precisando.”

“Deus  queira  que  dentro  de  vinte  anos  haja  uma  empresa   que  se  dedique  ao  nosso  Carnaval  e  dê  trabalho  às  pessoas  durante  o  ano”

No dia de Carnaval, Tânia Bandarra também integrará o desfile.  Antes, porém, estará atenta a todos os pormenores, desde a saída dos carros alegóricos deste armazém, até à passagem pela estradas e a entrada no recinto do corso, em Odiáxere. “Estaremos disponíveis para tudo aquilo que for preciso, como ir buscar comida para as pessoas que estão no armazém, carregar caixas, paletes, receber pessoas e tudo o mais necessário. Tudo aquilo que a Sofia nos indicar, pois ela coordena e nós fazemos. Estamos sempre em todas as frentes”, antecipa.

Foto de Arquivo

Aos fins-de-semana chegam a juntar-se naquele armazém mais de dez pessoas, o que até “faz muita diferença.” “Se num carro, estiverem duas pessoas num lado e outras duas no outro, a colar flores em papel, num instante este trabalho ficará feito”, garante.

Comparando com o de Loulé, Tânia Bandarra reconhece que o Carnaval de Odiáxere é muito artesanal. “Mas também foi assim que eles começaram. Deus queira que dentro de vinte anos haja uma empresa que se dedique só ao nosso Carnaval e dê trabalho às pessoas durante o ano. Para já, é muito artesanal, como todos nós dizemos. É a boa vontade de cada um de querer fazer as coisas e não deixar acabar uma tradição como esta. É como se diz neste armazém: «o Carnaval não se explica, sente-se.» É difícil explicar isto às pessoas que nunca participaram”, conclui Tânia Bandarra a poucas horas de terminar mais uma jornada de labuta a preparar, entre surpresas, o Carnaval de Odiáxere.

Reportagem de Paulo Silva e José Manuel Oliveira