Os três dias de luto decretados pela autarquia, terminam nesta quinta-feira, 02 de Novembro, Dia de Finados. Vai ser colocada uma placa toponímica, com o nome da antiga deputada, numa artéria da cidade, garante, em declarações ao ‘Litoralgarve’, o vice-presidente socialista da Câmara Municipal de Portimão, Álvaro Bila. E o vereador social-democrata Rui André sugere a rua onde se situa a sede concelhia do Partido Comunista Português, para essa homenagem a Margarida Tengarrinha, que passou cerca de vinte anos na clandestinidade, até Abril de 1974.
José Manuel Oliveira
«Estamos sempre a tempo de levar à prática os nossos sonhos, seja qual for a idade que tenhamos.» Foi esta a frase escrita, por debaixo da uma fotografia de Maria Margarida Carmo Tengarrinha Campos Costa, num pequeno cartão da Agência Funerária Malha, colocado numa mesa à entrada para o velório desta antiga deputada do Partido Comunista Português (PCP), na Assembleia da República, que decorreu durante a manhã e o início da tarde de terça-feira, dia 31 de Outubro de 2023, na Capela de São Pedro, na Igreja do Colégio dos Jesuítas, situada na Alameda da Praça da República, em Portimão.
Já numa parede, do lado direito do interior da capela, junto à urna, coberta com um manto vermelho do PCP, exibindo o símbolo da foice e martelo, lê-se, entre outras frases bíblicas, de Salmo 23: «Reconforta a minha alma e guia-me por caminhos rectos, por amor do seu nome» e
«A Tua Bondade e o Teu Amor
hão-de acompanhar-me todos os dias da minha vida;
e habitarei na Casa do Senhor
para todo o sempre».
Ex-deputado João Oliveira, membro da Comissão Nacional do Comité Central do PCP, e o socialista João Soares, entre as figuras presentes nas cerimónias fúnebres
A presidente da Câmara Municipal de Portimão, socialista Isilda Gomes, o vice-presidente Álvaro Bila, o vereador do PSD Rui André, a presidente da Assembleia Municipal de Portimão e deputada do PS pelo Círculo Eleitoral de Faro na Assembleia da República, Isabel Guerreiro, o presidente da Região de Turismo do Algarve, André Gomes, o empresário e presidente do NERA – Associação Empresarial da Região do Algarve, com sede em Loulé, Vítor Neto (antigo militante do PCP, mais tarde deputado do PS e, entre 1997 e 2002, secretário de Estado do Turismo, de governos do então primeiro-ministro António Guterres); o director regional no Algarve do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas, Castelão Rodrigues; o dirigente, nesta região, do Sindicato dos Trabalhadores dos Espectáculos, dos Audiovisuais e dos Músicos – CENA-STE, Luís Varela; Rui Sacramento, dirigente do PCP em Portimão, onde já ocupou o cargo de vereador do executivo camarário, e João Gameiro, director científico do Museu de Portimão, foram algumas das figuras algarvias que marcaram presença no velório de Margarida Tengarrinha.
Com 95 anos, nasceu a 07 de Maio de 1928, em Portimão, e faleceu a 26 de Outubro de 2023, no Hospital de Faro, poucos dias após ter sido estado internada. Segundo apurou o ‘Litoralgarve’, Margarida Tengarrinha, que se encontrava há mais de um ano no Centro de Apoio a Idosos da Raminha, na cidade de Portimão, tinha dado entrada no Hospital do Barlavento, em Portimão, antes de ser transferida para aquela unidade de saúde, na capital algarvia.
Já a nível nacional, compareceram nas cerimónias fúnebres de Margarida Tengarrinha, em Portimão, antes de a urna seguir no carro funerário em direção ao crematório em Albufeira, entre outros, João Oliveira, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP e ex-deputado da coligação da CDU na Assembleia da República pelo Círculo Eleitoral de Évora; e João Soares, editor literário e ex-deputado do PS pelo Círculo Eleitoral de Faro, sendo filho de Mário Soares, antigo primeiro-ministro e Presidente da República, já falecido.
Mais de uma dezena de coroas de flores
Além de três dias de luto decretados no município de Portimão, que curiosamente terminam no Dia de Finados, nesta quinta-feira, 02 de Novembro, o executivo camarário local prepara-se para atribuir “uma placa toponímica dedicada a Margarida Tengarrinha, numa artéria da cidade”, disse, ao ‘Litoralgarve’, o vice-presidente, Álvaro Bila.
Junto à urna de Margarida Tengarrinha foram colocadas mais de dez coroas de flores, umas maiores e outras mais pequenas, de diversas cores, entre cravos e outras espécies. No interior da capela de São Pedro chegaram a estar mais de cinquenta pessoas, de pé e sentadas, entre familiares e amigos da falecida, a que se iam juntando outras, perto da porta e no corredor do edifício, algumas em silêncio ou amena cavaqueira. No livro de condolências, muitas foram as palavras de homenagem a Margarida Tengarrinha e de solidariedade para com a sua família.
Quase uma centena de pessoas, no exterior, junto ao edifício da Igreja do Colégio dos Jesuítas, em Portimão, perto do carro funerário, no qual seguiram familiares de Margarida Tengarrinha e que transportou a urna para cremação em Albufeira. “Era uma mulher exemplar e merecia mais na hora despedida na sua terra-natal, uma homenagem mais robusta, por exemplo, com um discurso, ou a leitura de um poema, ou até um cântico, devido, nomeadamente, à sua ligação à cultura, às artes”, comentou, ao nosso Jornal, Rui André, vereador do PSD no executivo camarário portimonense
Eram 12h15m., quando três elementos da Agência Funerária Malha, com sede em Portimão, começaram a retirar, da capela de São Pedro, as coroas de flores e a urna de Margarida Tengarrinha, em direcção ao carro funerário. No exterior do edifício, com tempo nublado e temperatura de vinte graus centígrados, quase cem pessoas aguardavam a partida do veículo, no qual seguiram três familiares (duas filhas) de Margarida Tengarrinha, para Albufeira, onde teve lugar a cremação. O carro funerário saiu da Alameda da Praça da República, em Portimão, pouco depois das 12h30m.
“Era uma mulher exemplar e merecia mais na hora despedida na sua terra-natal, uma homenagem mais robusta, por exemplo, com um discurso, ou a leitura de um poema, ou até um cântico, devido, nomeadamente, à sua ligação à cultura, às artes, sector de que foi docente na Universidade Sénior de Portimão”, observou, ao ‘Litoralgarve’, o social-democrata Rui André, ex-presidente da Câmara Municipal de Monchique e actual vereador no executivo camarário portimonense, lamentando “não ter havido sensibilidade” nesse sentido. “Penso que a família não se iria opor”, acrescentou.
“Uma despedida insípida. Faltaram umas palavras a recordar Margarida Tengarrinha, uma mulher do povo, na rua”, ou “uma música de Zeca Afonso”
Um popular juntou-se a esse lamento, considerando que foi uma “despedida insípida.” “Faltaram umas palavras de homenagem a recordar Margarida Tengarrinha, uma mulher do povo, na rua”, notou. E Rui André voltou à carga para dizer, ao nosso Jornal, que, hora da partida, até podia ter havido “uma música de Zeca Afonso” em homenagem a esta antiga deputada comunista na Assembleia da República e na Assembleia Municipal de Portimão.
Já em relação à placa toponímica com o nome de Margarida Tengarrinha, que o vice-presidente do executivo camarário, Álvaro Bila, garantiu, em declarações ao ‘Litoralgarve’, o vereador social-democrata Rui André sugeriu, por exemplo, a rua onde se situa a sede do PCP, em Portimão, ou uma artéria na zona da Praia da Rocha, onde residia a senhora.
Margarida Tengarrinha aderiu ao PCP, em 1954, com 24 anos de idade, e em 1956 passou à clandestinidade, tendo saído para outro país, em 1962, após o assassinato do seu companheiro, José Dias Coelho. “Teve uma vida inteiramente dedicada à luta e intervenção pela emancipação dos povos, pela democracia, o progresso social, a paz e o socialismo”, destacam os comunistas, em comunicado
Este foi o comunicado enviado aos órgãos de comunicação social pelo Secretariado da Direção da Organização Regional do Algarve (DORAL) do Partido Comunista Português, em Faro, no dia 26 de Outubro de 2023, sobre o falecimento de Margarida Tengarrinha:
“É com profundo pesar que o Secretariado da Organização Regional do Algarve do Partido Comunista Português informa do falecimento de Maria Margarida Carmo Tengarrinha.
Nascida a 7 de Maio de 1928 em Portimão, Margarida Tengarrinha, desde jovem, participou nas lutas estudantis de 1949 e 1954 em Lisboa, tendo sido membro da Direcção Universitária do MUD Juvenil.
Participou nas Exposições Gerais de Artes Plásticas, tendo sido expulsa da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa – ESBAL, pelo papel desempenhado na direcção da luta pela Paz aquando da reunião da NATO em Lisboa em 1952.
Participou no Congresso Mundial de Mulheres realizado em Copenhaga, em 1953, e em 1963 em Moscovo.
Aderiu ao Partido Comunista Português, com 24 anos, em 1952. Margarida Tengarrinha passou à clandestinidade em finais de 1954. A sua primeira tarefa foi então a criação, com José Dias Coelho (seu companheiro), da “oficina” de produção de documentos de identificação e outros necessários à intervenção clandestina do Partido. Em 1962, após o assassinato de José Dias Coelho, Margarida Tengarrinha foi para o exterior tendo exercido tarefas na «Rádio Portugal Livre». Em 1968 regressa a Portugal, tendo participado na redacção do «Avante!» e do jornal «A Terra». Foi responsável pelos organismos do Trabalho Camponês da Organização do Norte e posteriormente de Lisboa.
Membro do Comité Central do PCP desde Maio de 1974 até 1988. Após o 25 de Abril de 1974, foi membro da Direcção da Organização Regional de Lisboa, integrou a Comissão para o Trabalho com os Pequenos e Médios Agricultores e a Comissão para a Reforma Agrária. Desde 1986 a viver em Portimão, integrou a Direcção da Organização Regional do Algarve do PCP.
Foi deputada à Assembleia da República nas III e IV legislaturas.
Ao longo dos anos, Margarida Tengarrinha publicou diversos livros sobre pintura, cultura popular e sobre a sua experiência e intervenção enquanto funcionária do PCP. Tem, também, uma vasta obra de artes plásticas. Foi professora na Universidade Sénior de Portimão, onde leccionava História das Artes.
Margarida Tengarrinha teve uma vida inteiramente dedicada à luta e intervenção pela emancipação dos povos, pela democracia, o progresso social, a paz e o socialismo.”
“No âmbito das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril de 1974, que estão a decorrer, o Município de Portimão apoiou a produção de diversas iniciativas culturais em torno da figura de Margarida Tengarrinha, nomeadamente o filme “Clandestina”, de Maria Mire, baseado no livro “Memórias de uma Falsificadora”, também escrito por Margarida Tengarrinha, que foi estreado no Festival Doclisboa e será brevemente apresentado em Portimão”, lê-se, numa de imprensa do executivo camarário, presidido por Isilda Gomes
Por sua vez, a Câmara Municipal de Portimão, que determinou três dias de luto – terça-feira, 31 de Outubro, quarta-feira, 01 de Novembro (feriado, Dia de Todos os Santos) e 02 de Novembro (Dia de Finados), pelo falecimento de Margarida Tengarrinha, divulgou um comunicado a 27 de Outubro:
“Na sequência do falecimento de Margarida Tengarrinha (…), o Município de Portimão determina a observância de Luto Municipal no dia 31 de outubro (…). Nascida em Portimão no ano de 1928, os seus 95 anos de vida enformam um percurso notável, digno de ser lembrado e homenageado pelas atuais e novas gerações.
Apaixonada por todas as artes, e especialmente dotada para a pintura e a literatura, onde se distinguiu, Maria Margarida Carmo Tengarrinha Campos Costa dedicou grande parte da sua vida a combater o regime salazarista, tendo sido mesmo forçada a passar à clandestinidade.
Durante os cerca de vinte anos que passou na clandestinidade, uma das suas principais tarefas foi a atividade de jornalista em órgãos de imprensa do PCP, como os jornais “Avante!”, “A Terra” (para os camponeses do Norte) e “A Voz das Camaradas” (boletim para as mulheres clandestinas), bem como a Rádio Portugal Livre.
Depois do 25 de Abril de 1974, foi eleita para o Comité Central do PCP e deputada pelo Algarve à Assembleia da República, cargo exercido de 1979 a 1987. Também foi membro da Assembleia Municipal de Portimão.
Terminado o último mandato na Assembleia da República, regressou definitivamente a Portimão. Desde então dedicou-se à pintura, tendo realizado várias exposições, iniciando também uma atividade pedagógica intensa, dando aulas de História da Arte no Instituto de Cultura de Portimão – Universidade Sénior, além de ter escrito os livros “Samora Barros, Pintor do Algarve”, editado pela Região de Turismo do Algarve em 1990, “Da Memória do Povo” – recolha da literatura popular de tradição oral”, publicado com o apoio da Câmara Municipal de Portimão, pela editora Colibri em 1999, e “Quadros da Memória”, pelas Edições Avante em 2004, entre numerosas comunicações aos congressos do Algarve, organizados pelo Racal Clube de Silves, entrevistas e artigos em vários órgãos de imprensa e conferências.
Com o irmão, o professor doutor José Manuel Tengarrinha, fez oferta do terreno onde se encontram instalados o Centro de Apoio a Idosos da Raminha e A Catraia – Centro de Acolhimento Temporário para Menores em Risco, ambos em Portimão.
Antes do Prémio Regional “Maria Veleda”, que lhe foi atribuído em 2014 pela Direção Regional de Cultura do Algarve, Margarida Tengarrinha foi distinguida, em 2005, pelo Município de Portimão, com a Medalha de Mérito Municipal – Grau Ouro.
No âmbito das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril de 1974, que estão a decorrer, o Município de Portimão apoiou a produção de diversas iniciativas culturais em torno da figura de Margarida Tengarrinha, nomeadamente o filme “Clandestina”, de Maria Mire, baseado no livro “Memórias de uma Falsificadora”, também escrito por Margarida Tengarrinha, que foi estreado no início desta semana no Festival Doclisboa e será brevemente apresentado em Portimão.
O Município de Portimão endereça à família enlutada as mais sentidas condolências.”