COVID- 19 – “O ALGARVE É A REGIÃO MAIS AFETADA ECONOMICAMENTE, ATENDENDO À FORTE IMPLANTAÇÃO DO SECTOR TURÍSTICO” E PREJUÍZOS DAS UNIDADES HOTELEIRAS “DEVERÃO ASCENDER, NO FINAL DO ANO, A 700 MILHÕES DE EUROS”

Em entrevista ao Litoralgarve, o presidente da Direção da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), Elidérico Viegas, diz que “os  prejuízos dos pouco mais de dois meses sem clientes rondam cerca de 300 milhões de euros”, admite não haver contratações de pessoal neste ano e aponta o regresso à normalidade só a partir da época turística de 2021. E deixa conselhos ao governo para garantir a competitividade do sector perante outros destinos turísticos internacionais.

Litoralgarve – Quantos hotéis e empreendimentos turísticos encerraram no Algarve devido à pandemia da Covid-19 e qual o montante dos prejuízos? Quantos milhões de euros já perderam?

Elidérico Viegas – A generalidade dos hotéis e empreendimentos turísticos do Algarve e do País encerrou e os que se mantiveram em funcionamento não têm clientes. A decisão em encerrar resultou da falta de clientes e não de uma qualquer medida administrativa e/ou imposição legal.

Considerando que mais de 70% da faturação tem lugar entre os meses de Junho e Setembro, os prejuízos deverão ascender, no final do ano, a cerca de 700 milhões de euros. Os prejuízos dos pouco mais de dois meses sem clientes rondam cerca de 300 milhões de euros.

FOTO DE ARQUIVO

Litoralgarve – O apoio concedido pelo governo foi o esperado ou ficou aquém das necessidades? 

Elidérico Viegas – As medidas aprovadas pelo governo para apoiar a economia, no âmbito da pandemia da COVID-19, estão no rumo certo, indo ao encontro às preocupações empresariais, designadamente o chamado “lay-off” simplificado, a que melhor serviu os interesses imediatos das empresas. No entanto, temos de reconhecer que muitas outras demoram em chegar às empresas e, por conseguinte, ficaram aquém dos objetivos pretendidos.

Litoralgarve – Quantas empresas e quantos trabalhadores estão em lay-off? Quais os reflexos dessa situação?

Elidérico Viegas – A generalidade das empresas recorreu ao “lay-off” simplificado, excetuando-se aquelas, poucas, diga-se, que por não cumprirem os requisitos exigidos não o puderam fazer. O maior reflexo terá sido, porventura, a não contratação dos trabalhadores sazonais, ou seja, aqueles que são contratados apenas para a chamada época turística.

“NO ATUAL CONTEXTO, HÁ SEMPRE EMPRESAS  INCUMPRIDORAS”

Litoragarve – Há unidades hoteleiras com salários em atraso. É o resultado da pandemia ou existem outros problemas?

Elidérico Viegas – Naturalmente que, no atual contexto, existem sempre empresas incumpridoras, quer porque não puderam aceder às medidas de apoio disponíveis, quer por se encontrarem menos consolidadas financeiramente.

“UM   MAU   ANO   TURÍSTICO” .COMPARADO   COM  2019

Litoralgarve – Há quem diga que este é um ano perdido em termos económicos. O que lhe parece?

Elidérico Viegas – O ano turístico, independentemente das expectativas positivas para o verão, quer ao nível da procura interna, quer no respeitante aos mercados externos, nunca será comparável ao verificado em 2019, sendo, nesta perspetiva, um mau ano turístico.

PRAIA DA MARETA

Litoralgarve – Quando será possível ao Algarve recuperar o turismo perdido?

Elidérico Viegas – Tudo indica que a recuperação poderá iniciar-se já no próximo verão, embora todos concordemos que o regresso à normalidade se possa verificar apenas a partir da época turística de 2021.

“EXISTEM BASTANTES   RESERVAS”   DO  MERCADO  PORTUGUÊS  PARA  OS  MESES   DE  JULHO  E  AGOSTO

Litoralgarve – Como perspetiva esta época turística? Já há reservas, para que meses e de onde são os turistas?

Elidérico Viegas – Existem bastantes reservas e fundadas expectativas relativamente ao bom comportamento do mercado interno, desde sempre o mais numeroso, quer em número de turistas, quer em dormidas, nos meses de Julho e Agosto.

Por outro lado, o facto de o Algarve poder vir a ser considerado um destino turístico COVID FREE, atendendo ao reduzido número de pessoas infetadas, traduz-se em valências comparativas face à concorrência mais direta e, por conseguinte, em vantagens competitivas importantes junto dos principais mercados emissores de turistas, situação que já se verifica, o que permite esbater os enormes prejuízos causados pela pandemia no turismo do Algarve.

“NÃO HOUVE OSCILAÇÃO NEGATIVA DOS PREÇOS PRATICADOS, APESAR DE SER DE ADMITIR QUE POSSA HAVER REAJUSTES EM BAIXA NO FUTURO PRÓXIMO”

Litoralgarve – Que efeitos tem a Covid-19 nos preços das diárias do alojamento?

Elidérico Viegas – É verdade que, quando a procura diminui, o preço tende a baixar e vice-versa. Contudo, no caso em apreço, o que determina a procura não é o preço, mas antes outros fatores, nomeadamente de incerteza, quer relativamente à evolução da própria pandemia nos países de origem dos turistas, quer no que se refere ao comportamento do transporte aéreo e restrições à saída de cidadãos para o exterior.

A procura externa vai depender, sobretudo, da forma como vão evoluir estes fatores de incerteza. Ou seja, o fator preço não é a razão fundamental para determinar a procura, pelo que, de uma maneira geral, não houve oscilação negativa nos preços praticados, apesar de ser de admitir que possa haver reajustes em baixa no futuro próximo.

Litoralgarve – As empresas vão contratar pessoal? Quantos trabalhadores são necessários?

Elidérico Viegas – A contratação de mão-de-obra sazonal está comprometida, conforme atestam os números oficiais do desemprego oficial. Não é previsível que haja lugar a mais contratações de pessoal neste ano.

REGRAS   DE  CONTROLO  SANITÁRIO  NAS  FRONTEIRAS  “NÃO  DEVEM   SER   EXCESSIVAMENTE  EXIGENTES  AO  PONTO  DE  DESMOTIVAREM  TODOS  AQUELES  QUE   NOS   PRETENDAM    VISITAR”

Litoralgarve  – Há autarcas e empresários no Algarve, que admitem que a  reabertura das fronteiras prevista para a segunda quinzena do mês de Junho poderá aumentar os casos de Covid-19 nesta região. Como encara essa situação? Deve haver controlo sanitário nos aeroportos e nas fronteiras terrestre e marítima?

Elidérico Viegas – Penso que devem ser aplicadas medidas que sejam capazes de, por um lado, induzir confiança nos turistas e, por outro, não serem excessivamente exigentes ao ponto de desmotivarem todos aqueles que nos pretendam visitar.

PRAIAS  COM  SEMÁFOROS,  LOTAÇÃO  MÁXIMA  E  DISTANCIAMENTO  ATÉ  PODERÃO  “POTENCIAR A   VINDA  DE  MAIS  TURISTAS  PORTUGUESES  E  ESTRANGEIROS  PARA  O  ALGARVE”

Litoralgarve – Lotação máxima nas praias, semáforos a indicar zonas com maior ou menos ocupação, e distanciamento entre as pessoas. Estas regras poderão afastar turistas de outros países para o Algarve? E quanto aos portugueses?

Elidérico Viegas – Penso, mais uma vez, que as medidas adotadas cumprem os princípios pretendidos, ou seja, induzir confiança sem serem demasiado exigentes e, por conseguinte, desmotivadoras.

Neste contexto, estas medidas podem funcionar até como potenciadoras da vinda de mais turistas nacionais e estrangeiros para o Algarve.

Litoralgarve – Como controlar aglomeração de pessoas?

Elidérico Viegas – Nos mesmos moldes que têm sido seguidos até aqui, consubstanciados no bom senso das pessoas e, quando necessário, através da ação policial.

REABERTURA DE  BARES  E  DISCOTECAS  É  “A  QUESTÃO  MAIS  SENSÍVEL” E  “DEVE  MERECER   TODA  A  ATENÇÃO   NECESSÁRIA”

Litoralgarve – Bares e discotecas ainda sem data para reabrirem. Como encara tal medida?

Elidérico Viegas – Esta é sem dúvida a questão mais sensível, devendo ser tratada com muito bom senso e equilíbrio por parte de quem de direito, a começar, naturalmente, pelas autoridades competentes. Trata-se de uma questão crítica e deve merecer toda a atenção necessária.

Litoralgarve – Que lição tira o Algarve com esta pandemia? O que é preciso fazer?

Elidérico Viegas – O Algarve é a região portuguesa mais afetada economicamente, atendendo à forte implantação do sector turístico na vida e sociedade regionais, carecendo, por isso mesmo, de medidas de discriminação positiva tendentes a garantir a sobrevivência da Indústria Turística e da região como destino turístico.

DO  LAY-OFF  SIMPLIFICADO E APOIO  AO EMPREGO, À  PROMOÇÃO  TURÍSTICA,  ISENÇÕES  FISCAIS E LINHAS DE CRÉDITO

itoralgarve- Como avalia a capacidade de resposta ao nível das autoridades de saúde?

Elidérico Viegas – Face à reduzida dimensão da doença na região, as autoridades de saúde estiveram ao nível do pretendido.

Litoralgarve – Que conselhos deixa ao governo?

Elidérico Viegas –  O governo tomou medidas de curto prazo (3 meses). Impõe-se agora dar seguimento e continuidade às medidas aprovadas anteriormente, ajustando-as às novas realidades decorrentes da reabertura das empresas, independentemente da designação que venha a ser adotada.

Assim, “lay-off” simplificado, medidas de apoio ao emprego, criação e reforço das linhas de crédito destinadas a recapitalizar empresas viáveis, prolongamento das moratórias, incluindo a atribuição de subvenções a fundo perdido, isenções fiscais, para além do reforço das verbas alocadas à promoção turística, encontram-se entre as medidas que mais se impõem no curto/médio prazos para responder eficazmente aos novos desafios decorrentes do aumento exponencial da concorrência de outros destinos.

Autor: José Manuel Oliveira