Entrevista exclusiva a Sara Coelho, vereadora da Câmara Municipal de Lagos: “Teremos até final do mandato, em 2025, de garantir condições para 266 habitações destinadas a arrendamento a custos controlados, com apoio do Estado”

“As pessoas muitas vezes dirigem-se a nós e estão muito focadas na resolução da sua própria situação habitacional e, portanto, tentam, de facto, exercer alguma pressão. Nós, no âmbito da atividade política, temos de ser imunes a isso”

“Aquilo que está previsto é que até 2026 tenhamos cerca de três mil famílias a necessitar de habitação no concelho de Lagos”

E “em 2030, passará para as seis mil famílias. Isto deriva de vários fatores, nomeadamente até da própria dinâmica familiar que se alterou. Temos mais famílias monoparentais, que resultam muitas vezes de situações de separação. Os dois elementos adultos do agregado familiar, quando se separam, necessitam de duas habitações ao invés da primeira única habitação, e, portanto, isto leva também ao crescimento das necessidades habitacionais.” 

“Não queria diabolizar aqui o Alojamento Local. Penso que temos de agradecer ao Alojamento Local este dinamismo como região e como concelho, nomeadamente na área turística, o que nos traz também muitas vantagens ao nível da economia” 

Numa altura em que a Carta Municipal de Habitação de Lagos prevê investimentos de 800 milhões de euros até 2035, como já foi referido publicamente, a vereadora responsável por este pelouro no executivo camarário local, Sara Coelho, em entrevista exclusiva ao «Litoralgarve», conta quais são os projectos da autarquia e garante que não cederá a pressões na atribuição de fogos.

Por outro lado, apesar das críticas que surgem ao nível do Alojamento Local, considera que estas unidades contribuem para fortalecer a economia. Já quanto aos elevados preços de arrendamento de habitação privada em Lagos, de que muitas pessoas se queixam, Sara Coelho lembra que se trata de uma questão de mercado, assegurando, que tal situação não está, neste momento, a afastar profissionais de várias áreas, nomeadamente professores, deste concelho. E aponta para “habitações partilhadas”, nomeadamente entre docentes, agentes de segurança, médicos e enfermeiros, de forma a evitar problemas no futuro. Já as pessoas sem-abrigo terão apoio por parte da Câmara Municipal de Lagos até conseguirem encontrar um espaço próprio para morar. E insiste que, ao abrigo da Constituição da República Portuguesa, é “competência do Estado garantir a habitação” para todos.

Paulo Silva

Litoralgarve – Quantas habitações sociais foram atribuídas no último concurso público lançado pela Câmara Municipal de Lagos e quais os critérios adotados?

Sara Coelho –  Nós atribuímos 47 habitações a vários agregados, dependendo da dimensão do agregado. Portanto, 47 habitações representam mais do que 47 pessoas e os critérios passam pelos rendimentos, pelas habilitações, pelo facto de ter ou não ter algumas situações que a lei prevê como sendo prioritárias, nomedamente a existência de situações de despejo e violência doméstica. Mas, também, devo dizer que o último concurso foi efetuado ao abrigo da lei do primeiro direito e, portanto, refiro que, a esse nível, podem candidatar-se as pessoas que vivem em condições indignas. E as condições indignas são estas que eu acabei de mencionar, não só a questão da violência doméstica, como de quem vive em sobrelotação, quem vive em habitações que não têm as devidas condições, que acabam por estar em situações indignas, entre outros casos.

Das 47 habitações recentemente atribuídas, “metade foi para arrendamento apoiado e outra metade para arrendamento acessível, isto para dizer que o nível médio de rendimentos do agregado familiar também era um fator a considerar para se poder aceder à habitação, sendo que o arrendamento apoiado requer um nível médio de rendimento mais baixo e o arrendamento acessível em vive em sobrelotação, quem vive em habitações que não têm as devidas condições, que acabam por estar em situações indignas, entre outros casos”

“O concurso foi público, foi publicado em edital, como aliás teria de ser. Como tal, os critérios também foram bem divulgados junto da população. Sabe-se perfeitamente que, nestas coisas, não se pode agradar a todos”

Prosseguindo: Destas 47 habitações, metade foi para arrendamento apoiado e outra metade para arrendamento acessível. Isto para dizer que o nível médio de rendimentos do agregado familiar também é um fator a considerar para se poder aceder à habitação, sendo que o arrendamento apoiado requer um nível médio de rendimento mais baixo e o arrendamento acessível já leva a que pessoas com um rendimento um pouquinho mais elevado também se possam candidatar. 

Portanto, foram estes os critérios que tivemos em conta. O concurso foi público, foi publicado em edital, como aliás teria de ser. Como tal, os critérios também foram bem divulgados junto da população. Sabe-se perfeitamente que, nestas coisas, não se pode agradar a todos.

“Não, não tenho conhecimento de que alguma das pessoas que tenha ficado com uma habitação atribuída, tenha habitação própria”

“No entanto, devo referir que a legislação, nomeadamente a lei do primeiro direito, salvaguarda algumas situações em que as pessoas podem ter habitação, como as que tenham habitação a mais de 100km do local onde residem atualmente. Há pessoas também que podem ter frações de habitações. E aqui estamos a falar de pessoas que sejam herdeiras, por exemplo, tenham herdado uma parte de uma casa e, portanto, são proprietárias, mas só de uma pequena fração e, como tal, não têm condições para habitar”

Litoralgarve – Surgiram informações, segundo as quais houve pessoas contempladas que já têm casa própria. 

Tem conhecimento destes casos? O que se passou concretamente?

Sara Coelho – Não, não tenho conhecimento de que alguma das pessoas que tenha ficado com uma habitação atribuída, tenha habitação própria. No entanto, devo referir que a legislação, nomeadamente a lei do primeiro direito, salvaguarda algumas situações em que as pessoas podem ter habitação, como as que tenham habitação a mais de 100km do local onde residem atualmente. Há pessoas, também, que podem ter frações de habitações. E aqui estamos a falar de pessoas que sejam herdeiras, por exemplo, tenham herdado uma parte de uma casa e, portanto, são proprietárias, mas só de uma pequena fração e, como tal, não têm condições para habitar. 

Ou,então, pessoas que tenham habitações, mais uma vez digo, a mais de 100km, e, por exemplo, essas habitações estejam arrendadas a terceiros, com contrato de arrendamento, evidentemente, mas que não seja possível habitar num curto espaço de tempo. Portanto, a lei salvaguarda isso. No entanto, sublinho, não tenho conhecimento de alguma situação que tenha ocorrido em Lagos. Admito que as pessoas podem dizer o que muito bem querem, o que muito bem lhes apetece, mas, de facto, dos processos e dos dados que temos, um dos documentos que nós solicitamos é a certidão das Finanças, que, no fundo, torna transparente se a pessoa tem ou se não tem propriedades em seu nome. Portanto, não tenho conhecimento de nenhuma situação muito menos verificada pelos nossos serviços através deste documento que eu referi. 

“Apresentámos a candidatura ao PRR [Plano de Recuperação e Resilência], a candidatura foi aprovada, mas mais tarde viemos a saber que, afinal, apesar desta aprovação, o Estado não nos garantia a totalidade do dinheiro, à volta de 40 e qualquer coisa milhões de euros, para que pudéssemos construir todas as habitações. Portanto, o município de Lagos tem de ter esta garantia de que existe o financiamento da parte do Estado. Estamos a trabalhar nesse sentido.”

“Para já, temos garantido o financiamento das habitações construídas em Bensafrim e no Sargaçal e que já foram atribuídas.  Quanto às restantes, estamos a aguardar a dita luz verde para que, de facto, esse financiamento venha”

“A Câmara Municipal tem estado, também, a adquirir terrenos. Adquirimos, nomeadamente, um terreno na zona das Caliças, que vai permitir construir um total de seiscentas habitações. Teremos, ainda, de analisar bem o terreno e fazer o projeto para perceber se vamos pelas seiscentas, ou um pouco menos.”

Litoralgarve – Quando terão lugar os próximos concursos e quantas pessoas serão contempladas?

Sara Coelho – Aquilo que fizemos, inicialmente, para avançar com as construções foi um documento estratégico que, aliás, faz parte da legislação para que pudéssemos candidatar ao PRR (Plano de Recuperação e Resilência), e que foi a Estratégia Local de Habitação.  E a Estratégia Local de Habitação prevê a construção de 266 fogos, sendo que estes serão construídos através do financiamento do PRR. Como referi no início, avançámos com um concurso para 47 habitações e agora prevemos, durante o ano de 2025, avançar com um concurso para as restantes habitações, sendo que temos de garantir, neste processo, que existe financiamento por parte parte do Estado. Apresentámos a candidatura ao PRR, a candidatura foi aprovada, mas mais tarde viemos a saber que, afinal, apesar desta aprovação, o Estado não nos garantia a totalidade do dinheiro, à volta de 40 e qualquer coisa milhões de euros, para que pudéssemos construir todas as habitações. Portanto, o município de Lagos tem de ter esta garantia de que existe o financiamento da parte do Estado. Estamos a trabalhar nesse sentido.

Para já, temos garantido o financiamento das habitações que foram construídas em Bensafrim, no Sargaçal e que já foram atribuídas. Quanto às restantes, estamos a aguardar a dita luz verde para que, de facto, esse financiamento venha. 

Não obstante essa situação, estamos a avançar com todos os procedimentos para fazer as construções que estão em falta até completar este número. A par disto, a Câmara Municipal de Lagos tem estado, também, a adquirir terrenos. Adquirimos, nomeadamente, um terreno na zona das Caliças, que vai permitir construir um total de seiscentas habitações. Teremos, ainda, de analisar bem o terreno e fazer o projeto para perceber se vamos pelas seiscentas, ou um pouco menos. 

E aqui a intenção é fazer a construção de habitações para venda. Ou seja, colocar também no mercado de habitação do município de Lagos um conjunto de habitações para venda a custos acessíveis, portanto, fora dos valores que são os valores e as práticas que temos atualmente no mercado privado. Mas contamos, em 2025, avançar com o próximo concurso. 

Litoralgarve – Qual o plano da Câmara Municipal de Lagos para famílias residentes, neste momento, no concelho e que poderão ficar sem habitação a partir de 2026, porque os senhorios não pretendem renovar contratos de arrendamento, que sabemos serem muitos, e outros casos que só se revelam na época balnear, bem como, também, para as pessoas que vivem na rua, os chamados sem-abrigo?

Sara Coelho – Estamos em período de consulta pública de um documento muito importante, que é a Carta Municipal de Habitação, a qual nos permitiu fazer um diagnóstico muito aprofundado da situação habitacional no município de Lagos. Trata-se de um diagnóstico que vai até para além do próprio diagnóstico em si e que foi efetuado no âmbito da Estratégia Local de Habitação. Esse documento permite-nos ter um horizonte temporal mais alargado do que o da Estratégia Local de Habitação. 

Aquilo que está previsto é que até 2026 tenhamos cerca de três mil famílias a necessitar de habitação no concelho de Lagos. Em 2030, passará para as seis mil famílias. Isto deriva de vários fatores, nomeadamente até da própria dinâmica familiar que se alterou. 

Litoralgarve – O que se passa em concreto a esse nível?

Sara Coelho – Temos mais famílias monoparentais, que resultam muitas vezes de situações de separação. Os dois elementos adultos do agregado familiar, quando se separam, necessitam de duas habitações ao invés da primeira única habitação, e, portanto, isto leva também ao crescimento das necessidades habitacionais. Este fator também é um daqueles que é tomado em consideração. É evidente que o Município de Lagos está a trabalhar no sentido de dar resposta à medida daquilo que consegue dar. 

E adianta: É ao Estado que cabe garantir habitação e, portanto, a partir do momento em que o Estado deposita nos municípios essa competência para fazer a habitação, tem, também, de disponibilizar os meios. Nesse sentido, refiro-me aos meios financeiros para podermos construir as habitações, até para evitar situações em que municípios com menor capacidade financeira não as possam garantir, porque não têm essa capacidade.  Caso o orçamento recaísse exclusivamente sobre a responsabilidade dos municípios, neste caso estes municípios nunca poderiam construir habitação.

No caso de Lagos, está numa boa situação financeira, mas tem, também, um outro conjunto de desafios para além da questão da habitação. 

Litoralgarve – Que desafios são esses?

Sara Coelho – Temos a questão das escolas, que têm de ser ampliadas e requalificadas. E, portanto, o orçamento municipal tem de ser distribuído por várias áreas necessárias à nossa atividade,  sendo que, repito, é competência do Estado garantir a habitação.

Portanto, temos de garantir este financiamento da parte do Estado e, aparentemente, o Estado estará a trabalhar nesse sentido e o município é evidente que também está. Trabalhar no sentido de garantir as 266 habitações que estão na Estratégia Local de Habitação e, como já referi, ainda para encontrar soluções alternativas, nomeadamente colocar, no mercado, habitações para aquisição também a custos controlados. 

“Foi através de um protocolo celebrado com a Segurança Social e uma instituição particular de solidariedade social, MAPS, sedeada em Faro, que nós avançámos com a abertura de uma casa de acolhimento para sem abrigo, em Lagos, e que permite colocar algumas pessoas em regime de residência temporária, porque a intenção não é que fiquem lá a residir permanentemente”

“O objectivo  é que aquela casa seja um trampolim para a reinserção social e para que as pessoas possam ter condições de higiene, de alimentação, serem acompanhadas pelos vários organismos do concelho de Lagos, nomeadamente Instituto de Emprego e Formação Profissional, o Centro de Saúde, a própria escola, com a educação, instituições que estão todas interligadas e podem intervir sobre a pessoa em situação de sem abrigo, no sentido de a reintegrar.”

Litoralgarve – E que soluções tem em relação às pessoas sem-abrigo no concelho de Lagos?

Sara Coelho – No que respeita à população sem-abrigo, nós estamos a acompanhar todas as situações existentes neste concelho, nomeadamente através da celebração de um protocolo com a Segurança Social e com uma Instituição Particular de Solidariedade Social, MAPS, que tem sede em Faro, mas possui uma área alargada de ação por todo o Algarve. Foi através deste protocolo celebrado com estas duas entidades, que avançámos com a abertura de uma casa de acolhimento para sem-abrigo, em Lagos, e que permite colocar algumas pessoas em regime de residência temporária, porque a intenção não é que fiquem lá a residir permanentemente. O objectivo é que aquela casa seja um trampolim para a reinserção social e para que as pessoas possam ter condições de higiene, de alimentação, serem acompanhadas pelos vários organismos do concelho de Lagos, nomeadamente o Instituto de Emprego e Formação Profissional, o Centro de Saúde, a própria escola, com a educação, instituições que estão todas interligadas e podem intervir sobre a pessoa em situação de sem abrigo, no sentido de a reintegrar. E uma vez em condições de ser reintegrada, a própria pessoa também tem de procurar alternativas habitacionais. Poderá ficar nesta habitação por um período máximo que vai de seis meses a um ano. Esse é o período necessário para se reintegrar.

Há, evidentemente, mais pessoas em situação de sem-abrigo do que aquelas que a casa de acolhimento permite acolher. Todas essas pessoas estão a ser acompanhadas porque existem equipas de rua, que fazem a referenciação destas pessoas. Também há um órgão municipal, que é o Instituto de Planeamento e Intervenção para a População Sem Abrigo, que faz toda a análise da população sem abrigo e procura arranjar respostas juntamente com as pessoas que estão nessa situação. Portanto, estamos permanentemente a monitorizar estas pessoas e a acompanhar a situação, no fundo, também, com os recursos e os próprios apoios do município e de outras entidades, tentando, assim, promover esta reintegração social.

“Uma das dificuldades com que nos deparamos tem sido, precisamente, o facto de as empresas de construção civil se debarem com muita falta de mão-de-obra e, portanto, dessa situação resulta alguma dificuldade em conseguir responder a todos os concursos e responder na velocidade que os municípios pretendem que seja dada”

Litoralgarve – Nos últimos anos, quantos fogos foram construídos e onde no concelho de Lagos?

Sara Coelho – Para já temos 16 habitações, 16 fogos que foram construídos e que já estão atribuídos em Bensafrim e no Sargaçal. Temos, ainda, em processo avançado, um conjunto de fogos na urbanização Chesgal, em Lagos. Na zona da cerca do cemitério está já a avançar, também, bem noutros locais, um projecto para um total de 47 fogos. 

Como referi atrás, está também já em fase de avançada – quando digo avançada, neste momento ainda não foi colocada a primeira pedra – mas já temos o estudo prévio, as especialidades, todo um conjunto de documentos que é necessário para avançar com os processos de

construção. Temos tido uma dificuldade que eu queria destacar e que não é exclusiva do município de Lagos, é transversal ao Algarve e a todo o país. Aliás, esta crise de habitação não é nem tão pouco exclusiva de Portugal, é uma crise europeia e até vai para fora das fronteiras da Europa.

Isto para dizer que uma das dificuldades com que nos deparamos tem sido, precisamente, o facto de as empresas de construção civil se debaterem com muita falta de mão-de-obra e, portanto, dessa situação resulta alguma dificuldade em conseguir responder a todos os concursos e responder na velocidade que os municípios pretendem que seja dada. Tal significa alguma dificuldade em conseguir construir rapidamente. Esta dificuldade é já do conhecimento do Estado, nomeadamente através da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que tem comunicado estes problemas. Portanto, o Estado tem perfeito conhecimento de que necessitamos de mão-de obra, precisamos de pessoal a trabalhar nas empresas de construção civil para que todo este ímpeto, toda esta vontade de construir se possa concretizar no terreno. 

“Temos pressões, mas não somos permeáveis a essas pressões” 

“A pressão que eu sinto, diariamente no meu trabalho, é a pressão que me leva a tentar ser eu a querer ser o mais justa possível, considerando todos os critérios que nós temos para a atribuição de habitação e, portanto, ter sempre em cima da mesa todo o universo de pessoas que estão inscritas na Câmara Municipal para a Habitação e olhar para os seus dados de maneira isenta e imparcial, independentemente das pressões que possam surgir”

Litoralgarve – Apesar de o Estado estar a trabalhar no sentido de dar respostas o mais célere possível, e sabendo nós – no início abordámos a falta de habitação, seja social ou mesmo a nível privado – sente pressão por parte de pessoas junto do município para a aquisição de casas? Se sente essa situação, qual é a medida que o município toma, neste caso, a parte da medição social?

Sara Coelho – As pessoas muitas vezes dirigem-se a nós e estão muito focadas na resolução da sua própria situação habitacional e, portanto, tentam, de facto, exercer alguma pressão. Nós, no âmbito da atividade política, temos de ser imunes a isso.

“Muitas pessoas chegam ao pé de mim e tentam comunicar, transmitir qual é a sua situação muito particular da habitação, às vezes até por receio que todos os elementos não estejam aqui integrados no município. Mas, como referi, a nossa missão é sermos imparciais, olharmos para todas as pessoas com o mesmo cuidado, com a mesma atenção e fazer a distinção entre situações mais urgentes e situações menos urgentes”

E sublinha: A pressão que eu sinto, diariamente no meu trabalho, é a pressão que me leva a tentar ser eu a querer ser o mais justa possível, considerando todos os critérios que temos para a atribuição de habitação e, portanto, ter sempre em cima da mesa todo o universo de pessoas que estão inscritas na Câmara Municipal para a Habitação e olhar para os seus dados de maneira isenta e imparcial, independentemente das pressões que possam surgir.

É evidente que quem dá a cara por um município, e falando em particular dos polouros que eu detenho, e o polouro da habitação é um deles, muitas pessoas chegam ao pé de mim e tentam comunicar, transmitir qual é a sua situação muito particular da habitação, às vezes até por receio que todos os elementos não estejam aqui integrados no município. Mas, como referi, a nossa missão é sermos imparciais, olharmos para todas as pessoas com o mesmo cuidado, com a mesma atenção e fazer a distinção entre situações mais urgentes e situações menos urgentes, sendo que não conseguimos, dada a quantidade elevada de inscrições que temos no nosso município, não conseguimos satisfazer todas as situações urgentes. 

“Não conseguimos, de facto, dar resposta a todas as situações que passam por aqui. E digo isto: também é desesperante para nós que estamos deste lado”

“Mas essa situação leva também à criação de um conjunto de soluções alternativas que, não sendo soluções habitacionais, ou seja, que não sendo a solução de ter uma casa municipal disponível para atribuir, serve de forma de suporte a que a pessoa possa somar ao seu rendimento um apoio municipal”

Isto leva a uma conclusão que é de que nós não conseguimos, de facto, dar resposta a todas as situações que passam por aqui. E digo isto: também é desesperante para nós que estamos deste lado. Mas essa situação leva também à criação de um conjunto de soluções alternativas que, não sendo soluções habitacionais, ou seja, que não sendo a solução de ter uma casa municipal disponível para atribuir, serve de forma de suporte a que a pessoa possa somar ao seu rendimento um apoio municipal. 

“O apoio ao arrendamento privado é uma forma que permite que o município, através de um regulamento próprio, possa apoiar o pagamento de parte da renda no mercado de arrendamento privado, ou os apoios sociais para a organização. Ou, então, outro tipo de apoios sociais que, no fundo, permite que a pessoa não tenha de despender tanto do seu salário, do seu rendimento pessoal, e que possa, recebendo parte do apoio através do município, despender esse valor para a habitação ou para outras áreas que considera prioritárias no âmbito da sua própria atividade e das suas próprias necessidades”

Esclarecendo: E aqui estou a falar do apoio ao arrendamento privado, que é uma forma que permite que o município, através de um regulamento próprio, possa apoiar o pagamento de parte da renda no mercado de arrendamento privado, ou os apoios sociais para a organização. Ou, então, outro tipo de apoios sociais que, no fundo, permite que a pessoa não tenha de despender tanto do seu salário, do seu rendimento pessoal, e que possa, recebendo parte do apoio através do município, pagar esse valor para a habitação ou para outras áreas que considera prioritárias no âmbito da sua própria atividade e das suas próprias necessidades. Portanto, a resposta é a seguinte: Sim, temos pressões, mas não somos permeáveis a essas pressões. 

“Devo dizer que o facto de se terminar um mandato não significa que quem venha a seguir não pegue naquilo que ficou, que já está feito e planeado e que não possa dar uma certa continuidade. A nível daquilo que estamos a fazer até ao final deste mandato é continuarmos permanentemente atentos às oportunidades que adveem, por exemplo, até do facto de nós nos podermos candidatar a financiamentos adicionais para avançar com construção”

Litoralgarve – Em 2025, chega ao final deste seu mandato como vereadora da Câmara Municipal de Lagos. O que proporcionará de novo para os anos seguintes ao nível da habitação social no concelho?

Sara Coelho – Devo dizer que o facto de se terminar um mandato não significa que quem venha a seguir não pegue naquilo que ficou, que já está feito e planeado, e que não possa dar uma certa continuidade. Ao nível daquilo que estamos a fazer até ao final deste mandato é continuarmos permanentemente atentos às oportunidades que adveem, por exemplo, até do facto de nos podermos candidatar a financiamentos adicionais para avançar com construção e, no fundo, também mostrar ao atual governo que o compromisso que foi firmado, nomeadamente através do Instituto de Habitação e de Reabilitação Urbana com a Estratégia Local de Habitação e dos ditos 266 fogos, deve ser cumprido.

Portanto, teremos até ao final do mandato, em 2025, de garantir as condições para que aquelas 266 habitações para arrendamento a custos apoiados, possam, de facto, ser construídas com o apoio financeiro do Estado. Temos, também, de estar muito atentos, como já referi, a todas as novas oportunidades que surjam. 

Daí termos efetuado a aquisição de um terreno, como também referi, que nos permitirá garantir mais opções de construção por parte das nossas populações. Isto, porque as soluções para a habitação não são uma; são diversas e, portanto, todo este leque de opções que temos, desde o arrendamento à aquisição, aos apoios sociais, é algo para que temos de estar muito atentos, de forma a garantir uma resposta sempre que seja necessário avançar com uma nova resposta.

“Até ao final de 2026, estamos em falta com 3 mil habitações no concelho de Lagos” 

Litoralgarve – Nesse ponto de vista, quantas habitações digamos, numa forma mais sintetizada, faltam no concelho de Lagos?

Sara Coelho – No âmbito da Carta Municipal de Habitação, no tal documento que está em consulta pública, até ao final de 2026, estamos em falta com 3 mil habitações no Concelho de Lagos. 

Como atrás referi, é claro que a responsabilidade da Habitação, e como indica a Constituição da República Portuguesa, pertence ao Estado, que, nesse sentido, depois transfere a competência para as câmaras municipais.

“Na prática, se as rendas estão elevadas é porque há quem arrende habitações por esses valores elevados. Porventura, essas competências poderão caber ao Estado, se entender, estabelecer um limite. Mas o Estado também não interfere, habitualmente, com o mercado privado.”

Litoralgarve – Sabendo-se que, em Lagos, o arrendamento privado está com preços pela ‘hora da morte’, como se costuma dizer, qual seria, na sua opinião, um valor do arrendamento correto, neste momento, face à situação socioeconómica do país, por um agregado familiar?

Sara Coelho – Não devo apontar aqui um valor correto, porque nós sabemos que os preços praticados no mercado de arrendamento privado, sublinho, são valores do mercado livre e, portanto, o município não tem condições, nem competências, para definir qual é o valor. Na prática, se as rendas estão elevadas é porque há quem arrende habitações por esses valores elevados.  

Porventura, essas competências poderão caber ao Estado, se entender, estabelecer um limite. Mas o Estado também não interfere, habitualmente, com o mercado privado, e portanto eu diria, insisto, que não há um valor correto. Isto, porque enquanto existirem estes valores, significa que há quem tenha condições para arrendar. O que nós temos é de procurar soluções. Nesse sentido, reafirmo que todo o sistema público, incluindo municípios e Estado, tem de as encontrar para aqueles que, dadas as condições existentes atualmente e no futuro venham a surgir. É necessário arranjar essas condições para que as pessoas possam ter direito e acesso a uma habitação condigna.

“Os dois agrupamentos de escolas [Júlio Dantas e Gil Eanes] conseguem colocar os professores de que necessitam, sendo que os casos de professores que não conseguem ter são completamente residuais e a situação tem vindo a ser resolvida com professores do próprio quadro das escolas. Ou seja, tem havido sempre uma garantia de que os alunos têm todas as aulas que constam do seu horário escolar e do seu ano lectivo.” 

“Independentemente disso, tem vindo a ser-nos comunicado pelos dois agrupamentos de escolas, que é cada vez mais difícil conseguir uma habitação para arrendar a preços acessíveis e, sobretudo, que permita que os professores fiquem durante todo o ano letivo, até porque estando nós numa região turística, muitas vezes em Abril já existem habitações que estão a ser arrendadas ou utilizadas para alojamento local e, portanto, não para arrendamento de longa ou média duração. Perante essa situação, acabam os ditos professores por não conseguir ter a alternativa habitacional.”

“Estamos a estudar a abertura de uma habitação partilhada que pode ser utilizada por professores, mas não só, por profissionais considerados necessários e estruturais para o funcionamento do nosso concelho, em que podem estar incluídos polícias, médicos, enfermeiros e professores, evidentemente, que no fundo nos façam muita falta”

“A solução poderá passar por quartos individuais, mais uma sala comum, uma cozinha comum, espaços comuns e que, no fundo, permitam uma resposta para estas situações”

Litoralgarve – Fala-se muito sobre o problema da colocação de professores em vários concelhos, não só do Algarve, mas por todo o país. Qual tem sido a resposta para o caso dos docentes que estão desesperadamente à procura de habitação? O que poderá a autarquia fazer para resolver este problema, ou ajudá-los nesse sentido?

Sara Coelho – Devo referir que no concelho de Lagos esse não tem sido propriamente um problema. Estamos em permanente contato com os dois agrupamentos de escolas, o Agrupamento de Júlio Dantas e o Agrupamento de Gil Eanes, no sentido de perceber como é que estão a evoluir no início de cada ano letivo as colocações dos professores. E aquilo que tem vindo a acontecer ao longo dos anos é que os dois agrupamentos de escolas conseguem colocar os professores de que necessitam, sendo que os casos de professores que não conseguem ter são completamente residuais e a situação tem vindo a ser resolvida com professores do próprio quadro das escolas. Ou seja, tem havido sempre uma garantia de que os alunos têm todas as aulas que constam do seu horário escolar e do seu ano lectivo. 

Independentemente disso, tem vindo a ser-nos comunicado pelos dois agrupamentos de escolas, que é cada vez mais difícil conseguir uma habitação para arrendar a preços acessíveis e, sobretudo, que permita que os professores fiquem durante todo o ano letivo, até porque estando nós numa região turística, muitas vezes em Abril já existem habitações que estão a ser arrendadas ou utilizadas para Alojamento Local e, portanto, não para arrendamento de longa ou média duração. Perante essa situação, acabam os ditos professores por não conseguir ter alternativa habitacional. A partir dessa altura, portanto, é mais difícil, não é que não consigam, mas é mais difícil.

Neste momento, estamos a estudar a situação e é provável que, no próximo ano letivo, já tenhamos uma resposta operacional.

Litoralgarve – De que forma?

Sara Coelho – Estamos a estudar a abertura de uma habitação partilhada que pode ser utilizada por professores, mas não só, por profissionais considerados necessários e estruturais para o funcionamento do nosso concelho, em que podem estar incluídos polícias, médicos, enfermeiros e professores, evidentemente, que no fundo nos façam muita falta. A solução poderá passar por quartos individuais, mais uma sala comum, uma cozinha comum, espaços comuns e que, no fundo, permitam uma resposta para estas situações.

Mas volto a sublinhar que, felizmente, no caso do concelho de Lagos, tal não tem vindo a ser necessário até à data.

“Não existem muitos dados, até à data, de que é o Alojamento Local que está a retirar habitações ao concelho. Devo referir que é o Alojamento Local, foi o Alojamento Local, que permitiu que casas que não eram utilizadas fossem reabilitadas e aproveitadas para aquela finalidade.”

“Foi, também, o Alojamento Local que permitiu criar um conjunto de postos de trabalho, de atividades turísticas, para dinamizar a atividade turística, ou reforçar a dinamização da atividade turística a par das unidades hoteleiras”

imagens aéreas de Lagos

Litoralgarve – O Alojamento Local está a agravar a situação de falta de habitação em Lagos, como se tem dito?

Sara Coelho – Não sei. Penso que não existem muitos dados, até à data, de que é o Alojamento Local está a retirar habitações ao concelho. Devo referir que é o AlojamentoLocal, foi o Alojamento Local, que permitiu quecasas, que não eram utilizadas, fossem reabilitadas e aproveitadas para aquelafinalidade. Foi, também, o Alojamento Local que permitiu criar um conjunto depostos de trabalho, de actividades turísticas, para dinamizar a actividade turística, ou reforçar a dinamização da actividade turística a par das unidades hoteleiras.

“No concelho de Lagos, das habitações que não estão a ser permanentemente utilizadas, só cerca de metade é utilizada em Alojamento Local e a outra metade em segundas habitações. Pertencem a pessoas que têm uma casa num outro ponto do país, ou noutro país,  e até utilizam estas casas como sendo suas casas de férias”

E acrescentou: No caso do concelho de Lagos, das habitações que não estão a ser permanentemente utilizadas, só cerca de metade é utilizada em Alojamento Local e a outra metade em segundas habitações. Pertencem a pessoas que têm uma casa num outro ponto do país, ou noutro país, e até utilizam estas casas como sendo suas casas de férias.

Nós, neste momento, com a Carta Municipal de Habitação, temos em cima da mesa, contudo, a possibilidade de equacionar que, em algumas zonas do concelho, nomeadamente aquelas que têm génese pública, portanto, áreas habitacionais que foram construídas ou que venham a ser construídas recorrendo a financiamentos municipais ou a financiamentos do Estado, devem servir um propósito social primeiramente. E, assim sendo, porventura essas áreas passarem a não ser utilizadas como áreas de Alojamento Local. Isso está em cima da mesa, está a ser equacionado e, portanto, é uma das possibilidades.

Mas não queria diabolizar aqui o Alojamento Local. Penso que temos de agradecer ao Alojamento Local este dinamismo como região e como concelho, nomeadamente, insisto, na área turística, o que nos traz também muitas vantagens ao nível da economia. Temos é de procurar soluções alternativas que nos permitam proporcionar habitação a todos aqueles que

necessitam. Não há nada, neste momento, que nos garanta, de facto, que estes atuais alojamentos locais sejam utilizados para arrendamento a longo prazo ou que não sejam meras habitações que ficam fechadas para que os seus proprietários possam utilizar como casas de férias. Muitas vezes trata-se também disso e que não quiseram colocar no mercado de arrendamento. Falta-nos esse estudo, faltam-nos esses dados.