Entrevista – Dirigente da ACRAL pede ao Presidente da República que exija ao Governo reforço de meios policiais mesmo fora do Verão e videovigilância para combater insegurança em Lagos

“Acreditamos que o Professor Marcelo Rebelo de Sousa compreenderá a urgência deste pedido e poderá ser um importante interlocutor junto do Governo e das entidades competentes, para que Lagos seja tratada de forma justa e proporcional à sua importância no contexto regional e nacional”, afirma, em entrevista ao ‘Litoralgarve’, Àngelo Mariano, coordenador da Associação do Comércio e Serviços da Região do Algarve (ACRAL). Nesse sentido, preparou um ‘dossier’ para apresentar ao Chefe de Estado, durante as cerimónias, do 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, em Lagos.

Por outro lado, aquele dirigente associativo explica o que provoca a falta de mão-de-obra em vários sectores económicos no Algarve, e com o início da época turística deixa recados aos empresários, admitindo que, como já aconteceu, há restaurantes em risco de encerrar durante o mês de Agosto por falta de trabalhadores. E lança, ainda, outros avisos.

José Manuel Oliveira

Litoralgarve- Que problemas sobre Lagos pretende expor ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no âmbito das cerimónias do 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, as quais têm lugar nesta cidade?

Ângelo Mariano – É uma honra para Lagos receber as comemorações do 10 de Junho e, com a presença do Senhor Presidente da República, temos uma oportunidade privilegiada para dar visibilidade às preocupações que afetam o nosso tecido económico e social.

O que pretendemos transmitir ao Professor Marcelo Rebelo de Sousa prende-se, essencialmente, com os desafios que o comércio local e os serviços enfrentam, nomeadamente a sazonalidade da economia, a crescente dificuldade em atrair e manter trabalhadores, e o impacto do aumento do custo de vida, sobretudo da habitação, que tem afastado residentes e condicionado o crescimento do setor.

Além disso, queremos também chamar a atenção para a necessidade de um maior investimento na mobilidade regional, tanto em transportes públicos como em infraestruturas, para que Lagos possa continuar a ser uma cidade atrativa, dinâmica e sustentável ao longo de todo o ano.

Estamos certos de que o Senhor Presidente, como sempre atento e próximo das populações, saberá levar estas preocupações ao mais alto nível institucional, contribuindo para que Lagos possa afirmar-se cada vez mais como um exemplo de equilíbrio entre desenvolvimento económico, qualidade de vida e valorização das nossas comunidades.

“A situação que se tem vivido em Lagos é profundamente preocupante e exige uma resposta concertada das autoridades, mas também uma forte consciência e ação da parte dos empresários”

“Da parte dos proprietários de estabelecimentos, é essencial que assumam um papel ativo na prevenção. Issopassa pela formação das equipas de trabalho para saberem lidar com situações de risco, pela contratação de segurança privada devidamente licenciada nos espaços de maior dimensão e, claro, pelo cumprimento rigoroso das normas relativas à venda e consumo de bebidas alcoólicas, nomeadamente não servindo clientes visivelmente embriagados.”

Litoralgarve- Numa altura em que aumenta a insegurança em Lagos, com tráfico de droga na via pública, denunciado por populares e empresários, assaltos a estabelecimentos e confusões em bares e outras unidades de diversão noturna, de que resultou, recentemente, um crime de homicídio, quais as medidas que devem ser tomadas para evitar este tipo de situações? O que podem os proprietários desses estabelecimentos fazer para prevenir problemas e controlar o consumo de bebidas alcoólicas?

Ângelo Mariano – A situação que se tem vivido em Lagos é profundamente preocupante e exige uma resposta concertada das autoridades, mas também uma forte consciência e ação da parte dos empresários. A segurança é um pilar essencial para o bom funcionamento da economia local, em especial num concelho que depende fortemente do turismo.

É fundamental reforçar a presença policial nas zonas mais críticas, sobretudo durante a noite e nos períodos de maior afluência. A ACRAL tem vindo a alertar para a necessidade de mais meios humanos e técnicos por parte das forças de segurança, mas também para a importância de uma articulação eficaz entre estas, o município e os empresários locais.

Da parte dos proprietários de estabelecimentos, é essencial que assumam um papel ativo na prevenção. Issopassa pela formação das equipas de trabalho para saberem lidar com situações de risco, pela contratação de segurança privada, devidamente licenciada nos espaços de maior dimensão e, claro, pelo cumprimento rigoroso das normas relativas à venda e consumo de bebidas alcoólicas, nomeadamente não servindo clientes visivelmente embriagados.

Também defendemos campanhas de sensibilização sobre consumo responsável, que devem envolver estabelecimentos, autarquia e escolas, com foco especial nos jovens. A prevenção, a vigilância e a responsabilização são, a nosso ver, as chaves para devolver a tranquilidade a Lagos e garantir que todos — residentes, comerciantes e visitantes — se sintam seguros na nossa cidade.

“Rua 25 de Abril, Praça Gil Eannes, Rua Infante de Sagres e a Avenida dos Descobrimentos, onde há grande movimento turístico, comércio e restauração” são zonas do centro histórico de Lagos onde devem ser colocadas câmaras de videovigilância

 Tal como “a envolvente da Marina de Lagos, as zonas de bares e discotecas, especialmente no Cais da Solaria e na zona da Meia Praia, e também as principais entradas e saídas da cidade, como a rotunda da EN125, garantindo uma maior cobertura preventiva”

Para o sistema de videovigilância“seria igualmente importante considerar zonas de grande afluência, como Odiáxere, Praia da Luz, Espiche e os acessos a zonas balneares muito procuradas, como a Praia do Camilo, a Ponta da Piedade e a Praia de Porto de Mós”

Litoralgarve- Onde devem ser instaladas as câmaras do sistema de videovigilância, aprovado pela Câmara Municipal de Lagos? Quais as zonas, ruas, avenidas, praças e outras artérias da cidade de Lagos e do concelho?

Ângelo Mariano – A aprovação do sistema de videovigilância por parte da Câmara Municipal de Lagos é um passo essencial para reforçar a segurança urbana e apoiar tanto os residentes, como os empresários. Contudo, é fundamental que a instalação destas câmaras seja feita de forma estratégica, com base em critérios objetivos e na realidade vivida no terreno.

Consideramos prioritária a cobertura das zonas de maior concentração de pessoas, como o centro histórico, nomeadamente a Rua 25 de AbrilPraça Gil EannesRua Infante de Sagres e a Avenida dos Descobrimentos, onde há grande movimento turístico, comércio e restauração.

Outros pontos críticos incluem áreas com histórico de ocorrências, como a envolvente da Marina de Lagos, as zonas de bares e discotecas, especialmente no Cais da Solaria e na zona da Meia Praia, e também as principais entradas e saídas da cidade, como a rotunda da EN125, garantindo uma maior cobertura preventiva.

No restante concelho, seria igualmente importante considerar zonas de grande afluência, como OdiáxerePraia da LuzEspiche e os acessos a zonas balneares muito procuradas, como a Praia do Camilo, a Ponta da Piedade e a Praia de Porto de Mós.

Reforçamos, no entanto, que a instalação deve respeitar os direitos dos cidadãos, assegurando que a videovigilância se destina exclusivamente à prevenção e apoio às autoridades em situações de risco. Acreditamos que, com esta medida, Lagos dará um passo firme no sentido de garantir mais segurança sem comprometer a liberdade e a hospitalidade que caracterizam a nossa cidade.

“Embora reconheçamos que o reforço policial durante o Verão é essencial devido ao aumento exponencial da população e da atividade turística, a verdade é que Lagos já não é apenas uma cidade sazonal”

Litoralgarve- Vai pedir ao Presidente da República o reforço de meios policiais, mesmo fora da época de Verão?

Ângelo Mariano –Sim, essa será uma das nossas principais reivindicações ao Senhor Presidente da República. Embora reconheçamos que o reforço policial durante o Verão é essencial devido ao aumento exponencial da população e da atividade turística, a verdade é que Lagos já não é apenas uma cidade sazonal. Temos vida comercial, social e cultural ativa durante todo o ano, e os problemas de segurança não se limitam aos meses de Verão.

Nos últimos tempos, temos assistido a um aumento de situações preocupantes, como furtos, tráfico de droga e desordens públicas, que exigem uma presença policial mais visível e permanente. Por isso, pediremos que o Estado reconheça a necessidade de reforçar os meios da PSP, de forma estruturada e contínua, com mais efetivos, melhores condições operacionais e investimento em equipamentos, incluindo a videovigilância.

Acreditamos que o Professor Marcelo Rebelo de Sousa compreenderá a urgência deste pedido e poderá ser um importante interlocutor junto do Governo e das entidades competentes, para que Lagos seja tratada de forma justa e proporcional à sua importância no contexto regional e nacional.

“A atuação da PSP em Lagos tem sido, no geral, positiva, tendo em conta os recursos limitados de que dispõe (…). Contudo, é evidente que a cidade precisa de um reforço efetivo de meios humanos e logísticos para garantir uma resposta mais eficaz e preventiva ao longo de todo o ano.”

Litoralgarve- O que pensa da atuação da Polícia de Segurança Pública, em Lagos?

Ângelo Mariano – A atuação da Polícia de Segurança Pública (PSP) em Lagos tem sido, no geral, positiva, tendo em conta os recursos limitados de que dispõe. Os agentes têm demonstrado grande empenho, profissionalismo e sentido de missão, muitas vezes a trabalhar em situações de enorme pressão, especialmente durante os meses de Verão. Contudo, é evidente que a cidade precisa de um reforço efetivo de meios humanos e logísticos para garantir uma resposta mais eficaz e preventiva ao longo de todo o ano.

A Polícia Municipal “tem procurado cumprir as suas funções com proximidade e diálogo, mas consideramos que a sua ação pode ser mais eficaz se houver maior articulação com as outras forças de segurança e um reforço dos meios disponíveis, sobretudo em termos de patrulhamento regular”

Litoralgarve – E da Polícia Municipal?

Ângelo Mariano – A Polícia Municipal tem um papel muito importante na fiscalização do espaço público, do trânsito, do comércio ambulante e na mediação de conflitos de natureza administrativa. Tem procurado cumprir as suas funções com proximidade e diálogo, mas consideramos que a sua ação pode ser mais eficaz se houver maior articulação com as outras forças de segurança e um reforço dos meios disponíveis, sobretudo em termos de patrulhamento regular.

“A GNR desempenha um papel essencial nas freguesias rurais e nas zonas periféricas do concelho, como Odiáxere, Bensafrim e Barão de São João. Tem feito um trabalho meritório na prevenção e no apoio às populações locais, mas também aqui é notória a carência de efetivos.”

Litoralgarve – E a Guarda Nacional Republicana?

Ângelo Mariano – A GNR desempenha um papel essencial nas freguesias rurais e nas zonas periféricas do concelho, como Odiáxere, Bensafrim e Barão de São João. Tem feito um trabalho meritório na prevenção e no apoio às populações locais, mas também aqui é notória a carência de efetivos. Defendemos que o concelho de Lagos, pela sua extensão territorial e características específicas, justifica um reforço da presença da GNR nas áreas fora da jurisdição da PSP.

Polícia Marítima? “Lagos, sendo um destino turístico fortemente ligado ao mar, necessita de uma presença mais robusta e visível desta força, especialmente durante a época balnear, para garantir a segurança de residentes, turistas e operadores marítimos”

“Também aqui é necessário reforçar os meios disponíveis e garantir uma atuação coordenada com a Capitania e outras entidades locais”

Litoralgarve – E em relação à Polícia Marítima?

Ângelo Mariano –A Polícia Marítima tem uma função vital na proteção da nossa costa, nas zonas balneares e na fiscalização da atividade marítima. Lagos, sendo um destino turístico fortemente ligado ao mar, necessita de uma presença mais robusta e visível desta força, especialmente durante a época balnear, para garantir a segurança de residentes, turistas e operadores marítimos. Também aqui é necessário reforçar os meios disponíveis e garantir uma atuação coordenada com a Capitania e outras entidades locais.

“A escassez de mão-de-obra no Algarve é um problema estrutural que afeta gravemente os setores da hotelaria, restauração, comércio e serviços. Estimativas recentes apontam para a necessidade de cerca de 8.000 trabalhadores adicionais na região até ao final de 2023, especialmente em áreas operacionais como alimentação, bebidas, alojamento e manutenção.”

“Durante a época alta, a carência pode atingir entre 7.000 a 10.000 trabalhadores, reflectindo a pressão sazonal sobre os serviços”

Litoralgarve- Como encara esta época turística em Lagos?

Ângelo Mariano –Encaramos esta época turística com um misto de expectativa e responsabilidade. Lagos continua a afirmar-se como um dos destinos mais procurados do Algarve, graças à sua beleza natural, ao património histórico, à oferta cultural e à qualidade dos seus serviços. Os sinais que temos recebido do sector, até ao momento, apontam para uma boa temporada, com níveis de reservas animadores e uma procura crescente por parte de mercados internacionais, mas também do turismo interno.

Contudo, esta confiança vem acompanhada de desafios. A pressão sobre os serviços públicos, a mobilidade, a segurança e a falta de mão-de-obra qualificada continuam a ser preocupações constantes. Além disso, os comerciantes e empresários locais estão muito atentos à necessidade de oferecer um serviço de qualidade, com preços justos, para manter a competitividade do destino e fidelizar quem nos visita.

Acreditamos que, com uma boa articulação entre autarquia, forças de segurança, empresários e comunidade local, será possível garantir uma época turística segura, equilibrada e economicamente positiva para todos.

Litoralgarve-  Surgem, todos os dias, ofertas de emprego, nomeadamente nos sectores da restauração, hotelaria, do comércio e serviços, neste concelho. Quantos trabalhadores são necessários para preencher as lacunas existentes?

Ângelo Mariano –A escassez de mão-de-obra é um dos maiores desafios que enfrentamos atualmente em Lagos, especialmente nos sectores da restauração, hotelaria, do comércio e dos serviços. Embora não disponhamos de números exactos para o nosso concelho, os dados nacionais fornecem uma perspectiva preocupante.

A nível nacional, a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) estima que faltam mais de 40 mil trabalhadores nestes setores, sendo que cerca de 15 mil são necessários apenas na hotelaria. Esta carência reflecte-se directamente em Lagos, um destino turístico de excelência que, durante a época alta, vê a sua população triplicar, aumentando exponencialmente a procura por serviços de qualidade.

As principais dificuldades de recrutamento concentram-se em funções como empregados de mesa, cozinheiros, rececionistas, pessoal de limpeza e manutenção. Esta situação é agravada pela sazonalidade do turismo, pela escassez de habitação acessível para os trabalhadores e pela necessidade de melhorar as condições laborais e salariais para atrair e reter talentos.

Para mitigar este problema, é fundamental implementar políticas públicas que incentivem a formação profissional, facilitem a contratação de trabalhadores estrangeiros e promovam a melhoria das condições de trabalho. Só assim poderemos garantir a sustentabilidade e a qualidade dos serviços que fazem de Lagos um destino de eleição.

Albufeira, Loulé, Faro, Portimão e Lagos são os concelhos mais afectados por falta de trabalhadores no sector turístico 

Litoralgarve- E ao nível do Algarve, quantos faltam? Quais são os concelhos mais afetados pela situação de ausência de mão-de-obra?

Ângelo Mariano –A escassez de mão-de-obra no Algarve é um problema estrutural que afeta gravemente os setores da hotelaria, restauração, comércio e serviços. Estimativas recentes apontam para a necessidade de cerca de 8.000 trabalhadores adicionais na região até ao final de 2023, especialmente em áreas operacionais como alimentação, bebidas, alojamento e manutenção. Durante a época alta, a carência pode atingir entre 7.000 a 10.000 trabalhadores, refletindo a pressão sazonal sobre os serviços.

Os concelhos mais afetados por esta escassez são aqueles com maior concentração turística e densidade populacional, nomeadamente:

·         Albufeira: Um dos principais destinos turísticos do Algarve enfrenta uma elevada procura por profissionais na hotelaria e restauração;

·         Loulé: Incluindo Vilamoura, apresenta uma intensa atividade turística, exigindo um número significativo de trabalhadores sazonais;

·         Portimão: Com uma oferta hoteleira e de restauração considerável, também sente a pressão da falta de mão-de-obra;

·         Faro: Sendo a capital da região e um centro administrativo, enfrenta desafios na contratação para diversos sectores;

·         Lagos: Destino turístico em crescimento, com necessidades crescentes de pessoal qualificado.

Esta situação é agravada por fatores como a sazonalidade do turismo, a escassez de habitação acessível para os trabalhadores e a necessidade de melhorar as condições laborais para atrair e reter talentos. A falta de mão-de-obra não só compromete a qualidade dos serviços prestados, mas também limita o crescimento económico da região.

Para mitigar este problema, é essencial implementar políticas públicas que incentivem a formação profissional, facilitem a contratação de trabalhadores estrangeiros e promovam a melhoria das condições de trabalho. Além disso, a construção de habitação a custos controlados é uma medida crucial para fixar trabalhadores na região.

Carência de habitação a preços acessíveis, dificuldade de valorização das carreiras ligadas à hotelaria, restauração e ao comércio, tanto a nível salarial, como de reconhecimento social, além de burocracia nos processos de contratação de trabalhadores oriundos de outros países, e ausência de investimento em valorização profissional contribuem para a falta de trabalhadores no Algarve

Litoralgarve – Qual o principal motivo da falta de mão-de-obra?

Ângelo Mariano -A falta de mão-de-obra no concelho de Lagos e em toda a região do Algarve resulta de um conjunto de fatores que se têm vindo a agravar nos últimos anos. Em primeiro lugar, destacamos a sazonalidade do turismo, que cria picos de procura muito intensos em períodos curtos, dificultando a estabilidade e a retenção de trabalhadores.

Outro fator é a falta de habitação acessível, que impede muitos profissionais, sobretudo os mais jovens e os estrangeiros, de se fixarem na região. Este é, talvez, o problema mais urgente, pois mesmo quando há disponibilidade de trabalhadores, estes não encontram condições para viver condignamente.

Também enfrentamos dificuldades na valorização das profissões ligadas à hotelaria, restauração e comércio, quer ao nível salarial, quer no reconhecimento social. Muitos jovens optam por outras áreas ou emigram em busca de melhores condições e estabilidade.

burocracia nos processos de contratação de estrangeiros também representa um entrave, sobretudo quando falamos de trabalhadores oriundos de países fora da União Europeia, que muitas vezes estão disponíveis para ocupar estas vagas, mas enfrentam obstáculos legais e administrativos.

Por fim, é necessário mencionar a falta de investimento em formação profissional ajustada às reais necessidades do setor. Precisamos de mais cursos técnicos, parcerias com escolas profissionais e incentivos à requalificação de adultos para responder às exigências do mercado de trabalho atual.

Esta é uma situação complexa que exige uma resposta articulada entre Governo, autarquias, associações empresariais e entidades de ensino, para garantir soluções estruturais e sustentáveis.

“É urgente acelerar os processos de legalização e entrada de trabalhadores estrangeiros, especialmente de países com acordos de cooperação com Portugal”

“Jovens em férias escolares ou estudantes universitários, por exemplo, poderiam ser incentivados a integrar o mercado de trabalho durante o Verão”

“Temos de encontrar soluções criativas, como reabilitar edifícios públicos devolutos ou criar residências temporárias, em parceria com a autarquia, para alojar trabalhadores sazonais. Sem alojamento, não conseguimos fixar mão-de-obra, por mais disponível que esteja”

Litoralgarve- E como será possível resolver o problema, sobretudo durante os meses de Julho e Agosto, com maior afluência turística?

Ângelo Mariano – A resolução do problema da falta de mão-de-obra, especialmente nos meses críticos de Julho e Agosto, exige medidas imediatas e coordenadas. A curto prazo, acreditamos que é essencial atuar em três frentes:

1. Reforçar os mecanismos de contratação temporária nacional e internacional:
É urgente acelerar os processos de legalização e entrada de trabalhadores estrangeiros, especialmente de países com acordos de cooperação com Portugal. As empresas precisam de respostas rápidas do SEF e de apoio prático no acolhimento e integração desses trabalhadores.

2. Criar incentivos para o trabalho sazonal:
Devem ser implementados apoios e incentivos para atrair trabalhadores nacionais, como subsídios de deslocação ou alojamento temporário, em articulação com a autarquia e empresas locais. Jovens em férias escolares ou estudantes universitários, por exemplo, poderiam ser incentivados a integrar o mercado de trabalho durante o Verão.

3. Colaboração entre empresários e entidades públicas para garantir alojamento digno:
Temos de encontrar soluções criativas, como reabilitar edifícios públicos devolutos ou criar residências temporárias, em parceria com a autarquia, para alojar trabalhadores sazonais. Sem alojamento, não conseguimos fixar mão-de-obra, por mais disponível que esteja.

Naturalmente, estas medidas devem ser acompanhadas por um esforço dos empresários para oferecer condições laborais atrativas, formação adequada e um ambiente de trabalho justo e motivador. Só assim conseguiremos responder à pressão turística dos meses de Verão e manter o nível de qualidade que os visitantes esperam de Lagos.

“A contratação de trabalhadores estrangeiros, nomeadamente de nacionalidade brasileira e de origem asiática, tem sido fundamental para colmatar as carências de mão-de-obra na nossa região”

“No setor do turismo, por exemplo, cerca de 90% da mão- de-obra imigrante no Algarve é proveniente do Brasil, Índia e Nepal. Estes profissionais têm desempenhado um papel crucial na resposta à procura turística, especialmente durante os picos sazonais.”

“O setor da construção já enfrenta um défice estimado de 80.000 profissionais”

Litoralgarve- A contratação de trabalhadores estrangeiros, nomeadamente de nacionalidade brasileira e de origem asiática, resolve carências?

Ângelo Mariano – Como Coordenador  da ACRAL em Lagos, posso afirmar que a contratação de trabalhadores estrangeiros, nomeadamente de nacionalidade brasileira e de origem asiática, tem sido fundamental para colmatar as carências de mão-de-obra na nossa região. Setores como o comércio, turismo, a agricultura e construção civil enfrentam desafios significativos na contratação de pessoal, e a presença destes trabalhadores tem sido essencial para manter a atividade económica.

No setor do turismo, por exemplo, cerca de 90% da mão- de-obra imigrante no Algarve é proveniente do Brasil, Índia e Nepal. Estes profissionais têm desempenhado um papel crucial na resposta à procura turística, especialmente durante os picos sazonais.

No entanto, é importante reconhecer que a contratação de trabalhadores estrangeiros não é uma solução isolada. A recente revogação do mecanismo de manifestação de interesse aumentou a rigidez e morosidade dos processos de legalização, dificultando a contratação de mão-de-obra estrangeira, especialmente no setor da construção, que já enfrenta um défice estimado de 80.000 profissionais.

Portanto, embora a contratação de trabalhadores estrangeiros seja uma resposta eficaz às carências de mão- de-obra, é fundamental implementar políticas que garantam a sua integração plena e o reconhecimento das suas qualificações, assegurando condições laborais justas e equitativas.

“Muitos setores, como a construção civil, hotelaria e agricultura, oferecem salários que não são competitivos face ao custo de vida atual. Além disso, as condições de trabalho nem sempre são atrativas, o que leva muitos portugueses a procurar oportunidades no estrangeiro, onde podem obter melhores remunerações e condições laborais.”

Litoralgarve- Porque faltam portugueses para trabalhar? Muitos preferem receber subsídio de desemprego e outros apoios sociais, como se fala? Queixam-se de salários baixos? De quem é a culpa?

Ângelo Mariano –Em Lagos, tenho acompanhado de perto os desafios que o setor empresarial enfrenta no que diz respeito à escassez de mão-de-obra. A falta de trabalhadores portugueses disponíveis para certas funções não se deve a uma única causa, mas sim a uma combinação de fatores estruturais e conjunturais:

1. Salários Baixos e Condições de Trabalho

Muitos setores, como a construção civil, hotelaria e agricultura, oferecem salários que não são competitivos face ao custo de vida atual. Além disso, as condições de trabalho nem sempre são atrativas, o que leva muitos portugueses a procurar oportunidades no estrangeiro, onde podem obter melhores remunerações e condições laborais.

2. Desajuste entre Oferta e Procura

Existe um descompasso entre as qualificações dos trabalhadores disponíveis e as necessidades do mercado. Muitas vezes, as competências dos candidatos não correspondem às exigências das vagas disponíveis, dificultando o preenchimento dessas posições.

3. Envelhecimento da População e Emigração

Portugal enfrenta um envelhecimento demográfico significativo, com uma redução da população ativa. Simultaneamente, muitos jovens qualificados optam por emigrar em busca de melhores oportunidades, agravando a escassez de mão-de-obra no país.

4. Perceção sobre Apoios Sociais

Embora exista a perceção de que alguns preferem manter-se em apoios sociais em vez de aceitar empregos mal remunerados, é importante notar que a maioria dos beneficiários do subsídio de desemprego está à procura de trabalho. No entanto, quando os rendimentos do trabalho são quase equivalentes ou inferiores ao apoio social, o incentivo para aceitar certas propostas diminui.

Litoralgarve- E de quem é a responsabilidade?

Ângelo Mariano – A responsabilidade é partilhada entre vários agentes:

  • Empresas: Necessitam de oferecer condições mais atrativas para reter e atrair trabalhadores;
  • Estado: Deve implementar políticas que incentivem a formação profissional e a valorização das carreiras;

. Sociedade: É fundamental combater estigmas associados a determinadas profissões e promover uma cultura de valorização do trabalho.

“A restauração enfrenta desafios significativos devido à falta de pessoal qualificado. Em localidades como Albufeira, houve casos de restaurantes que se viram obrigados a fechar portas em pleno mês de agosto por não conseguirem reunir equipas suficientes para operar. Este fenómeno não é isolado e pode estender-se a outras áreas do Algarve, incluindo Lagos, caso não sejam implementadas soluções eficazes”

Litoralgarve- Há restaurantes que poderão correr o risco de condicionar a entrada de clientes, em Agosto, devido à falta de trabalhadores? Que outros setores também estão em perigo a esse nível? E onde, em concreto? Em que localidades?

Ângelo Mariano – Posso afirmar que a escassez de mão- de-obra é uma preocupação crescente que afeta diversos setores na região, especialmente durante o pico turístico de agosto.

Restauração em risco de limitar atendimento

A restauração enfrenta desafios significativos devido à falta de pessoal qualificado. Em localidades como Albufeira, houve casos de restaurantes que se viram obrigados a fechar portas em pleno mês de agosto por não conseguirem reunir equipas suficientes para operar. Este fenómeno não é isolado e pode estender-se a outras áreas do Algarve, incluindo Lagos, caso não sejam implementadas soluções eficazes.

Hotelaria, construção civil e pesca também em risco com falta de trabalhadores

Setores também em perigo

Além da restauração, outros setores enfrentam dificuldades semelhantes:

·         Hotelaria: A falta de trabalhadores qualificados compromete a qualidade dos serviços prestados aos turistas.

·         Construção civil: A escassez de mão-de-obra qualificada tem levado a atrasos em projetos e aumento dos custos.

·         Pesca: A falta de formação e de profissionais disponíveis afeta a operação das embarcações, especialmente na pesca artesanal .

Localidades mais afetadas

As localidades mais impactadas incluem:

·         Albufeira: Com uma elevada concentração de estabelecimentos turísticos, enfrenta dificuldades significativas na contratação de pessoal.

·         Lagos: A crescente procura turística pressiona os serviços locais, que lutam para manter padrões de qualidade devido à escassez de trabalhadores.

·         Faro e Portimão: Como centros urbanos importantes, também sentem os efeitos da falta de mão-de-obra nos setores mencionados.

“Compreendo a preocupação da Câmara Municipal de Albufeira em implementar um Código de Conduta que visa regular comportamentos na via pública, especialmente durante a época alta do turismo. A intenção de preservar a imagem do concelho e garantir o bem-estar dos residentes é legítima.”

“No entanto, é crucial que tais medidas sejam equilibradas e não comprometam a atratividade turística da região. A proibição do uso de trajes de banho fora das zonas balneares e o consumo de bebidas alcoólicas na via pública devem ser comunicadas de forma clara aos visitantes, para evitar mal-entendidos e garantir o cumprimento das normas.”

Litoralgarve- O que acha do Código de Conduta, dos Comportamentos, criado pela Câmara Municipal de Albufeira, que proíbe, nomeadamente, a presença de mulheres em biquini e homens em tronco nú, na via pública e em transportes públicos, além do consumo de bebidas alcoólicas nesses locais, aplicando multas?

Ângelo Mariano – Compreendo a preocupação da Câmara Municipal de Albufeira em implementar um Código de Conduta que visa regular comportamentos na via pública, especialmente durante a época alta do turismo. A intenção de preservar a imagem do concelho e garantir o bem-estar dos residentes é legítima.

No entanto, é crucial que tais medidas sejam equilibradas e não comprometam a atratividade turística da região. A proibição do uso de trajes de banho fora das zonas balneares e o consumo de bebidas alcoólicas na via pública devem ser comunicadas de forma clara aos visitantes, para evitar mal-entendidos e garantir o cumprimento das normas.

É importante, também, considerar a uniformização de regulamentos entre os diferentes municípios do Algarve, para que os turistas tenham uma experiência consistente e positiva em toda a região. A colaboração entre as autarquias, associações empresariais e outros ‘stakeholders’ é essencial para encontrar soluções que conciliem a ordem pública com a hospitalidade que caracteriza o Algarve.

Em resumo, apoia-se a iniciativa de promover comportamentos adequados na via pública, desde que implementada com bom senso, diálogo e respeito pelos direitos dos visitantes e residentes.

Litoralgarve- É mesmo possível controlar essas situações?

Ângelo Mariano -Enquanto Coordenador da ACRAL em Lagos, considero que o controlo de comportamentos como andar em tronco nu ou consumir bebidas alcoólicas na via pública é possível, mas exige coordenação, bom senso e recursos adequados.

É possível controlar, mas com limitações:

·         É uma questão de civismo e prevenção, mais do que de repressão. Não se trata de transformar o espaço público num ambiente hostil para o turista, mas sim de garantir o respeito pelas regras de convivência.

·         Requer campanhas de sensibilização eficazes, multilingues e visíveis, tanto em espaços públicos como em alojamentos, transportes e zonas balneares.

·         A fiscalização tem de ser direcionada e proporcional, garantindo que haja autoridade suficiente (PSP, GNR ou Polícia Municipal) para aplicar sanções quando necessário, sem recorrer ao excesso.

Desafios reais:

·         O Algarve recebe centenas de milhares de turistas num curto espaço de tempo. Fiscalizar cada situação individual é logisticamente muito difícil.

·         A perceção do turista é fundamental. Um controlo excessivo pode gerar má publicidade e afastar visitantes, algo que todos — setor público e privado — querem evitar.

Solução passa pela pedagogia e colaboração:

·         As empresas, como bares, restaurantes, hotéis e operadores turísticos, devem ser parceiras ativas na divulgação do código de conduta.

·         Uniformizar regras entre municípios vizinhos evita confusão e reforça a mensagem de que o Algarve é uma região organizada e respeitadora.

“A implementação de um código de conduta como o de Albufeira não deve ser vista como uma forma de afastar turistas, mas sim como uma tentativa de disciplinar comportamentos que, em excesso, colocam em risco a qualidade de vida local e a imagem do destino turístico.Objetivo: disciplinar, não afastar”

Litoralgarve-Mas vai mesmo disciplinar ou afastar turistas?

Ângelo Mariano – Diria que a implementação de um código de conduta como o de Albufeira não deve ser vista como uma forma de afastar turistas, mas sim como uma tentativa de disciplinar comportamentos que, em excesso, colocam em risco a qualidade de vida local e a imagem do destino turístico.

Objetivo: disciplinar, não afastar

  • O Algarve, e em particular concelhos como Lagos ou Albufeira, vivem do turismo — e queremos continuar a acolher bem quem nos visita.
  • No entanto, há comportamentos — como o consumo abusivo de álcool na via pública, ou circular em trajes impróprios em zonas urbanas — que causam desconforto à população residente, ao comércio local e até a outros turistas.

O equilíbrio é essencial

  • Se o código for aplicado com bom senso, comunicação clara e respeito cultural, contribuirá para melhorar a experiência turística, promovendo um ambiente mais seguro e organizado.
  • Se, pelo contrário, for percecionado como uma imposição rígida ou mal explicada, poderá gerar resistência e afetar negativamente a reputação do destino.

A aposta deve ser na pedagogia

  • Informar, sinalizar e envolver os operadores turísticos são passos-chave.
  • As normas devem ser vistas como parte da identidade local — e não como barreiras.

Portanto, se bem aplicado, o código de conduta pode disciplinar comportamentos sem afastar turistas, reforçando a atratividade do Algarve como destino de qualidade.

“Na qualidade de Coordenador da ACRAL em Lagos, defendo que a adoção de normas de conduta semelhantes às de Albufeira deve ser considerada por Lagos e outros concelhos turísticos do Algarve, mas com adaptação à realidade local e envolvimento de todas as partes interessadas”

Litoralgarve- Lagos deveria seguir essas normas? E outros concelhos turísticos do Algarve?

Ângelo Mariano – Na qualidade de Coordenador da ACRAL em Lagos, defendo que a adoção de normas de conduta semelhantes às de Albufeira deve ser considerada por Lagos e outros concelhos turísticos do Algarve, mas com adaptação à realidade local e envolvimento de todas as partes interessadas.

Lagos: equilíbrio entre tradição e turismo

  • Lagos é uma cidade com forte identidade histórica e cultural, que atrai turistas não só pelo sol e praia, mas também pelo seu património e tranquilidade.
  • A adoção de um código de conduta pode ajudar a proteger essa identidade, garantindo que os comportamentos na via pública respeitem o ambiente urbano e a comunidade local.

Outros concelhos turísticos devem considerar o mesmo

  • Albufeira, Portimão, Loulé(Vilamoura) Tavira ou Vila Real de Santo António (Monte Gordo) enfrentam problemas semelhantes no Verão: consumo excessivo de álcool, comportamentos desordeiros, trajes inadequados em zonas não balneares.
  • Uma abordagem regional coordenada poderia ser benéfica, criando regras claras e uniformes que tornem mais fácil a comunicação com os visitantes e o trabalho das autoridades locais.

Mas com diálogo e adaptação

  • Cada concelho tem características e públicos distintos. As regras devem ser flexíveis e respeitar a cultura local, evitando soluções “copiadas” sem contextualização.
  • O mais importante é que estas normas sejam pedagógicas, não punitivas, promovendo um turismo sustentável e respeitador.

Concluindo, sim, Lagos e outros concelhos turísticos devem ponderar medidas semelhantes, desde que aplicadas com bom senso, envolvimento da comunidade e respeito pela liberdade dos visitantes.