Entrevista ao comandante dos Bombeiros Voluntários de Vila do Bispo, Emerson Gomes: “Verão será de muita pressão, não só em relação a incêndios rurais, como ao nível da intervenção pré-hospitalar”
Comandante dos Bombeiros Voluntários de Vila do Bispo, desde 18 de Novembro de 2022, e coordenador municipal da Proteção Civil, Emerson Gomes, natural de Mindelo (Cabo Verde), antevê “um Verão duro, com temperaturas muito elevadas e condições meteorológicas muito adversas”, garante existirem “todas as condições” para enfrentar incêndios rurais, devido ao dispositivo existente e à experiência noutros anos, e diz que as “faixas estratégicas” em zonas florestais “estão devidamente limpas.”
Em declarações ao ‘Litoralgarve’, no final da sessão comemorativa do 42º. aniversário da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vila do Bispo, que decorreu no dia 30 de Maio (feriado), o comandante Emerson Gomes procurou, acima de tudo, transmitir um sinal de confiança à população residente e aos visitantes face ao período do Verão que se aproxima. Mas também aproveitou, de forma cautelosa, para deixar recados perante os riscos existentes no concelho, nomeadamente ao nível das falésias e em estradas secundárias. Isto, numa altura em que considera que o corpo de bombeiros está dotado de meios humanos e equipamentos para enfrentar os desafios próprios de um maior fluxo de pessoas a esta zona da costa vicentina nesta época do ano.
José Manuel Oliveira
Litoralgarve – Como encara o Verão de 2024 em termos de fogos rurais e florestais no concelho de Vila do Bispo?
Emerson Gomes – O Verão é sempre uma incógnita, na realidade. Neste momento, temos todas as condições criadas para enfrentar a situação, devido ao dispositivo que já está montável e tem muita experiência. Vamos ter um Verão duro, com temperaturas muito elevadas e condições meteorológicas muito complexas. Mas com o sistema que está montado no Algarve vamos dar, com certeza, uma boa resposta.
Litoralgarve – E como está a limpeza das matas e de outros terrenos nesta zona?
Emerson Gomes – Há algumas áreas a que não conseguimos chegar. Mas no que respeita às faixas de maior importância, neste momento estamos prontos para arrancar o Verão com todas as condições.
Litoralgarve – Quais são essas faixas a que não conseguem chegar?
Emerson Gomes – São faixas que estão devidamente definidas na floresta. As faixas são estratégicas. Consideramos que nos podem ajudar no combate. Estão devidamente limpas. Há um trabalho anualmente feito nesse sentido.
“Em Junho, vamos ter só uma equipa dedicada a incêndios rurais e constituída por cinco elementos. Depois, a partir de Julho até Setembro, durante 24 horas por dia teremos duas equipas com cinco elementos, ou seja, dez, no total, para o combate a fogos e o apoio de dois veículos autotanques”
Litoragarve – Pessoas consideradas nómadas a viver em tendas, barracas e roulottes, poderão provocar problemas em zonas rurais, no tocante a fogos, por simples descuidos, como aconteceu há anos?
Emerson Gomes – Não tenho esses dados. O que sei é que as pessoas que estão na floresta são pessoas. Perante qualquer ocorrência, teremos de saber lidar com a situação.
Litoralgarve – Como funciona o dispositivo de prevenção e combate a fogos rurais e florestais neste concelho?
Emerson Gomes – Agora, em Junho, vamos ter só uma equipa dedicada a incêndios rurais e constituída por cinco elementos. Depois, a partir de Julho até Setembro, durante 24 horas por dia teremos duas equipas com cinco elementos, ou seja, dez, no total, para o combate a fogos e apoio de dois veículos autotanques. Ficarão [de prevenção] no quartel e nalguns pontos do concelho, em face de estados de alerta.
“As nossas falésias são a área em que temos maior ‘know-how’, com a equipa de salvamento em grande ângulo. Muitos sítios estão associados a acidentes normais e outros estão associados à erosão da costa”
Litoralgarve – As falésias na área do concelho de Vila do Bispo, onde se têm registado quedas de pescadores lúdicos e de turistas, também obrigam os bombeiros a um alerta permanente, devido aos perigos existentes…
Emerson Gomes – As nossas falésias são a área em que temos maior ‘know-how’, com a equipa de salvamento em grande ângulo. Muitos sítios estão associados a acidentes normais e outros estão associados à erosão da costa.
Litoralgarve – E como estão os equipamentos, nomeadamente cordas, cabos e outro material para descer nas falésias e socorrer pessoas em quedas?
“Podemos considerar que temos condições topo de gama do ponto de vista do salvamento em grande ângulo. Temos é de manter o alerta e treinar, treinar, treinar. Porque mais do que termos equipamentos, temos de ter homens prontos para intervir em situações de emergência. As arribas são muitas vezes traiçoeiras.”
Emerson Gomes – Foi feita uma boa aposta nesse sentido por parte da Direção da Associação Humanitária dos Bombeiros, com o apoio da Câmara Municipal de Vila do Bispo e das Juntas de Freguesia. Estamos bem munidos de material e temos um veículo só mesmo dedicado ao salvamento em grande ângulo, com todas as condições de normativo europeu. Podemos considerar que temos condições topo de gama do ponto de vista do salvamento em grande ângulo. Temos é de manter o alerta e treinar, treinar, treinar. Porque mais do que termos equipamentos, temos de ter homens prontos para intervir em situações de emergência. As arribas são muitas vezes traiçoeiras.
Nas falésias, “quando as pessoas estão de férias parece que [têm a sensação de que] o risco é reduzido e desligam-se da prevenção, o que é normal. Por isso, cabe-nos a nós insistir em campanhas de sensibilização e informação pública.”
Litoralgarve – Tem havido alertas para os riscos existentes nas falésias, com grande altura, onde, por vezes, os turistas se aventuram a fotografar e a filmar os locais devido ao ambiente paisagístico?
Emerson Gomes – A nível da população civil, temos feito esse trabalho. Temos feito alertas para as pessoas que não conhecem esta zona da Costa Vicentina e vão para falésias de grande altura. Estamos a falar de pescadores lúdicos, que por não conhecerem a área, aventuram-se e acabam por sofrer acidentes. Depois, temos casos pontuais de turistas que às vezes arriscam e as coisas correm mal. Quando as pessoas estão de férias, parece que [têm a sensação de que] o risco é reduzido e desligam-se da prevenção, o que é normal. Por isso, cabe-nos a nós insistir em campanhas de sensibilização e informação pública.
Equipa de salvamento aquático dos Bombeiros Voluntários de Vila do Bispo irá socorrer pessoas que caírem ao mar, em articulação com a Autoridade Marítima Nacional e o Instituto de Socorros a Náufragos
Litoralgarve – O salvamento aquático é uma nova aposta dos Bombeiros Voluntários de Vila do Bispo. O que vai ser feito em concreto?
Emerson Gomes – Estamos a tentar ter uma equipa com essa valência. Queremos formalizar essa equipa. É uma área da Polícia Marítima, que, depois, coincide com a nossa equipa de salvamento em grande ângulo. E é importante que a equipa tenha, depois, a capacidade para ter uma atuação, como é óbvio sempre em parceria com a Polícia Marítima e o Instituto de Socorros a Náufragos.
Litoralgarve – Como funcionará?
Emerson Gomes – No fundo, irá acompanhar a Autoridade Marítima junto ao mar. Quando alguém cai junto ao mar, às vezes somos os primeiros a chegar e com essa valência [equipa de salvamento aquático], conseguiremos dar uma melhor resposta.
Litoralgarve – Irão procurar pessoas que caírem ao mar?
Emerson Gomes – Iremos acompanhar a Autoridade Marítima, que tem a competência nessa área.
Litoralgarve – E quando entrará em atividade?
Emerson Gomes – Estamos a trabalhar nesse sentido.
“Muitas vezes existe a ideia de que [a pressão pré-hospitalar] só acontece nas grandes cidades. Mas não é assim. É preciso ter aqui equipas reforçadas pré-hospitalares. Já se começa a sentir essa necessidade, pois o Verão está aí. Teremos mais elementos e quatro ambulâncias de socorro.”
Litoralgarve – Como perspetiva o Verão?
Emerson Gomes – Não só em relação a incêndios rurais, como ao nível da intervenção pré-hospitalar, vamos ter uma pressão muito grande. Muitas vezes existe a ideia de que tal só acontece nas grandes cidades. Mas não é assim. É preciso ter aqui equipas reforçadas pré-hospitalares. Já se começa a sentir essa necessidade, pois o Verão está aí.
Litoralgarve – E como são os reforços a esse nível?
Emerson Gomes – Temos duas equipas durante 24 horas durante todo o ano. No Verão, teremos mais elementos e quatro ambulâncias de socorro.
No concelho de Vila do Bispo, “há estradas municipais e em zonas rurais sem grandes condições de sinalização, nem grande passagem de pessoas, e onde muitas vezes existe a tendência de os condutores das viaturas acelerarem um pouco mais. E às vezes as coisas correm mal.”
Litoralgarve – Quais são as estradas mais perigosas no concelho de Vila do Bispo: a Estrada Nacional 125, ou a Estrada Nacional 268 à entrada de Sagres?
Emerson Gomes – Toda a Estrada Nacional 125 e a Estrada Nacional 268 têm riscos. Por outro lado, há estradas municipais e em zonas rurais sem grandes condições de sinalização, nem grande passagem de pessoas, e onde muitas vezes existe a tendência de os condutores das viaturas acelerarem um pouco mais. E às vezes as coisas correm mal.
“O que o Algarve está a fazer, e bem, é repensar o sistema de alerta a sismos para conseguir que essa resposta seja, efetivamente, regional”
Litoralgarve – Numa zona sísmica com a do Cabo de São Vicente, em Sagres, onde se registam com frequência abalos, às vezes mais do que um por dia, como estão os bombeiros preparados para enfrentar uma situação complexa, que obrigue à retirada de pessoas?
Emerson Gomes – É uma situação que não pode ser vista de uma forma isolada. Posso preparar a minha resposta. Se um sismo tiver epicentro aqui, vou ter problemas. Por isso, o que o Algarve está a fazer, e bem, é repensar o sistema de alerta a sismos para conseguir que essa resposta seja, efetivamente, regional.
“Os sismos que aconteceram em Marrocos e na Turquia trouxeram-nos, também, maiores preocupações”
Litoralgarve – Mas está preparado para um sismo com maior intensidade?
Emerson Gomes – Neste momento, estamos com projeto com espanhóis, num sistema de aviso-alerta para a população. Depois, quanto ao resto estamos a falar de equipamentos com os bombeiros. É necessário que seja uma aposta regional, com uma estrutura regional para o efeito. Os sismos que aconteceram em Marrocos e na Turquia trouxeram-nos, também, maiores preocupações.
“O quartel precisa de um projeto de reabilitação, sobretudo. Não porque o edifício esteja em mau estado. Não. O edifício está em bom estado (…)Temos de ampliar o parque. Temos de repensar a questão das camaratas, temos de pensar num espaço específico para a preparação física, um ginásio, para que os nossos bombeiros possam treinar, e abrir esse espaço também à população.”
Litoralgarve – O quartel dos Bombeiros de Vila do Bispo reúne condições para a vossa atividade, ou necessita de ser ampliado?
Emerson Gomes – Este quartel foi pensado numa determinada altura para ter uma resposta. Hoje, temos uma resposta completamente diferente, com mais veículos e mais capacidade. O quartel precisa de um projeto de reabilitação, sobretudo. Não porque o edifício esteja em mau estado. Não. O edifício está em bom estado. Mas nós crescemos e o edifício foi pensado noutra altura, como referi.
Litoralgarve – O que é necessário fazer agora?
Emerson Gomes – Temos de ampliar o parque. Temos de repensar a questão das camaratas, temos de pensar num espaço específico para a preparação física, um ginásio, para que os nossos bombeiros possam treinar, e abrir esse espaço também à população.
“Penso que 70 operacionais nos deixariam numa situação mais confortável”, numa altura em que há 52 bombeiros no quadro activo, com capacidade para 67 elementos
Litoralgarve – Quantos bombeiros tem Vila do Bispo?
Emerson Gomes – Somos 52 no quadro ativo, com capacidade para 67 elementos.
Litoralgarve – E quantos seriam necessários?
Emerson Gomes – Penso que 70 operacionais nos deixariam numa situação mais confortável.