Entrevista a Alexandre Nunes, vereador da CDU na Câmara de Lagos e, novamente, candidato a presidente: Há “1 590 agregados familiares” sem habitação no concelho

“No entanto, o relatório conta apenas quem está inscrito, não abrange todas as situações”, observou, nesta entrevista concedida ao ‘Litoralgarve’, Alexandre Nunes, vereador da CDU – Coligação Democrática Unitária (Partido Comunista Português e Partido Ecologista ’Os Verdes’) na Câmara Municipal de Lagos, após a recente apresentação, no Centro Cultural desta cidade, dos elementos que encabeçam as listas de candidatos aos órgãos autárquicos do concelho, nas eleições que terão lugar no dia 12 de Outubro de 2025.

Para Alexandre Nunes, que se candidata de novo a presidente da edilidade lacobrigense, o problema da falta de habitação “é muito grave” e “o executivo do PS não soube prever, tendo contribuído para o seu agravamento.”

Ao fazer um balanço sobre este mandato, prestes terminar, lembrou que, “apesar de muitas terem sido aprovadas pela maioria absoluta do PS”, as propostas da CDU “não foram aplicadas pelo executivo, ficaram, como se costuma dizer, na gaveta.” Apontou o que falta a Lagos e referiu a área em que se encontra preparado para gerir no município.

José Manuel Oliveira

Litoralgarve – Que balanço faz sobre este seu primeiro mandato como vereador da CDU na Câmara Municipal de Lagos?

Alexandre Nunes – O balanço é agridoce. Procurei estar sempre informado sobre quais os problemas concretos das pessoas e de como os resolver, tal como é possível verificar na actividade e contributos que fui mantendo nas reuniões. Estou contente porque sinto que cumpri os compromissos que assumi com a população, nomeadamente as várias propostas que apresentei e que resolviam problemas da população.

O lado menos bom existe porque, apesar de muitas terem sido aprovadas pela maioria absoluta do PS, não foram aplicadas pelo executivo, ficaram, como se costuma dizer, na gaveta.

“As práticas do executivo excluem a oposição na elaboração dos documentos/políticas na maior parte das vezes. É por isso que se torna importante combater esta maioria absoluta.”

“Muitos documentos chegavam às reuniões já fechados, impedindo uma participação séria por parte da oposição. Dou como exemplo o orçamento municipal, em que apresentei cem (100) propostas e nenhuma foi considerada. Não houve abertura para fazer qualquer alteração ao documento final!”

Litoralgarve – Como foi integrar um executivo de maioria absoluta do PS durante estes quatro anos?

Alexandre Nunes – A resposta acaba por estar dada na questão anterior, porque apesar de ter apresentado propostas que contribuíram para melhorias concretas, como por exemplo gratuitidade [nos transportes] da Onda para os menores de 18 anos e maiores de 65 residentes no Concelho, a maioria absoluta muitas vezes impunha-se de uma forma pouco democrática. Muitos documentos chegavam às reuniões já fechados, impedindo uma participação séria por parte da oposição. Dou como exemplo o orçamento municipal, em que apresentei cem (100) propostas e nenhuma foi considerada. Não houve abertura para fazer qualquer alteração ao documento final!

As práticas do executivo excluem a oposição na elaboração dos documentos/políticas na maior parte das vezes. É por isso que se torna importante combater esta maioria absoluta.

“Após estes quatro anos, sinto que estou preparado para qualquer pelouro (…) No entanto, dada a minha ligação à educação e à sustentabilidade, sinto-me particularmente capacitado para essas áreas: educação, ambiente e mobilidade”

Litoralgarve – Se pudesse ter ocupado um pelouro, qual escolheria?

Alexandre Nunes – Após estes quatro anos, sinto que estou preparado para qualquer pelouro, sobretudo graças à competência técnica dos trabalhadores da Câmara, mas também devido à equipa que apresentámos a eleições, em áreas tão distintas, como a arquitetura, urbanismo, arte, saúde e ambiente. No entanto, dada a minha ligação à educação e à sustentabilidade, sinto-me particularmente capacitado para essas áreas: educação, ambiente e mobilidade.

“Os vereadores da oposição só tomaram conhecimento da nova identidade gráfica no momento da apresentação pública”.

 O que teria feito a CDU sobre essa matéria e a polémica escultura numa rotunda de Lagos

Litoralgarve – Concorda com a nova identidade gráfica de Lagos? Era mesmo necessária? Quais os custos?

Alexandre Nunes – Não me oponho à renovação da identidade gráfica. Gostaria, no entanto, de ter acesso a mais dados para poder suportar a minha opinião, como por exemplo os custos estimados da alteração. O que tenho a certeza é que o processo poderia e deveria ter sido mais participado. Os vereadores da oposição só tomaram conhecimento da nova identidade no momento da apresentação pública.

Litoralgarve – Se fosse presidente da Câmara Municipal, como teria conduzido esse processo?

Alexandre Nunes – Teria feito de forma distinta:

1. – Apresentaria a proposta em reunião de Câmara e Assembleia Municipal, incluindo o orçamento estimado, com base em referências de outros municípios e não só do estudo e alteração da identidade gráfica, mas também do custo da sua implementação no Concelho.

2. – Avançaria com um concurso de ideias, com júri plural, incluindo representantes da sociedade civil e das áreas artísticas.

3. – Submeteria os resultados à auscultação pública.

4. – A escolha final teria em conta o regulamento e a opinião da população.

Litoralgarve – E sobre a escultura na rotunda junto à Avenida dos Descobrimentos, que tem gerado polémica nas redes sociais?

Alexandre Nunes – O que critico é novamente o processo. Repetiria o modelo participativo que referi anteriormente — apresentação à Câmara (com decisão de um teto máximo para a obra), concurso de ideias com júri plural, consulta pública e decisão informada.

Não é o meu papel julgar se a peça é “bonita ou feia”. A arte é subjetiva. As redes sociais são espaços legítimos de opinião, mas não podem ser o suporte das decisões políticas.

As carências existentes em Lagos, na perspectiva da CDU

Litoralgarve – Quais são as principais preocupações da população de Lagos?

Alexandre Nunes – A maior preocupação é o custo de vida, especialmente o acesso à habitação. A pressão turística e a especulação imobiliária agravam esta situação. Outras preocupações frequentes são o acesso à saúde, o ordenamento do território e os transportes públicos. Uma outra questão que está muito na ordem do dia, a imigração, também tem importância e deve merecer a atenção de quem está à frente da autarquia, de modo a que esta comunidade seja recebida com dignidade, que existam condições para garantir a sua integração e que a sua presença na nossa comunidade possa ser benéfica para todos.

Litoralgarve – O que falta neste concelho?

Alexandre Nunes – A lista é longa, mas destaco algumas prioridades:

– Habitação social e a custos controlados;

– Mais salas de aula, em especial no pré-escolar;

– Um hospital com todas as valências e os devidos equipamentos de suporte;

– Uma política com uma visão global do Concelho;

– Na área da mobilidade (interligação entre os diferentes transportes e a ligação pedonal/ciclável);

– Integração dos diferentes tipos de património — natural, cultural e arquitectónico, através de uma organização que promova a sua proteção, recuperação e valorização, inserida numa estratégia coerente de gestão com informação acessível e estruturada.

Os projectos de habitação recentemente anunciados pela Câmara Municipal de Lagos “são importantes, mas surgem com atraso tremendo e em número claramente insuficiente face às necessidades reais do concelho, tal como várias vezes referi em reuniões de câmara”

Litoralgarve – Como vê os projectos de habitação social recentemente anunciados pela Câmara Municipal de Lagos?

Alexandre Nunes – São importantes, mas surgem com atraso tremendo e em número claramente insuficiente face às necessidades reais do concelho, tal como várias vezes referi em reuniões de câmara.

Deveríamos estar, neste momento, a avançar para novas soluções:

– Estímulo à criação de cooperativas e auto construção;

– O chamado “zonamento inclusivo” que condiciona as grandes operações de construção à disponibilização de fogos de rendas/custos acessíveis.

No concelho de Lagos, “segundo a Carta Municipal de Habitação, com base nos Censos 2021, existem 1.183 casas devolutas. As causas são várias: especulação, heranças por resolver, imóveis afogados em burocracia ou afetação ao alojamento local”

“A recusa do PS em aprovar Áreas de Reabilitação Urbana nas freguesias agrava o problema. Essas áreas ofereceriam incentivos à recuperação de imóveis”

Litoralgarve – Quantas casas estão devolutas no concelho de Lagos? E a que se deve essa situação?

Alexandre Nunes – Segundo a Carta Municipal de Habitação, com base nos Censos 2021, existem 1.183 casas devolutas. As causas são várias: especulação, heranças por resolver, imóveis afogados em burocracia ou afetação ao alojamento local.

A recusa do PS em aprovar Áreas de Reabilitação Urbana nas freguesias agrava o problema. Essas áreas ofereceriam incentivos à recuperação de imóveis.

Litoralgarve – Quantas famílias e pessoas estão sem habitação? Como vivem?

Alexandre Nunes – Segundo o relatório de habitação de 2024, o número é de 1 590 agregados familiares. No entanto, o relatório conta apenas quem está inscrito, não abrange todas as situações, pois além das que são enquadradas na chamada habitação social, temos ainda muitos casos de famílias da classe média que acabam por abandonar o Concelho por falta de alternativas. Este é um dos grandes dramas, pessoas que se vêem forçadas a abandonar a sua vida por falta de habitação. Há também muitas famílias que vivem sobrelotadas com familiares, outras em situações precárias, como caravanas, quartos sem condições ou mesmo situações-limite de insalubridade. É um problema muito grave que o executivo do PS não soube prever, tendo contribuído para o seu agravamento.

“A CDU não está a disputar o terceiro ou quarto lugar. Está a disputar a presidência da Câmara” Municipal de Lagos. “De qualquer modo, a perda da maioria absoluta [do PS] poderá ser positiva: permitirá governar de forma mais plural, ouvir mais vozes e construir soluções mais sólidas.”

Litoralgarve – Como encara a possibilidade de o PS poder perder a maioria absoluta na Câmara Municipal de Lagos, nas próximas eleições autárquicas?

Alexandre Nunes – A CDU não está a disputar o terceiro ou quarto lugar. Está a disputar a presidência da Câmara. De qualquer modo, a perda da maioria absoluta poderá ser positiva: permitirá governar de forma mais plural, ouvir mais vozes e construir soluções mais sólidas.

Seria uma mudança para uma visão mais solidária, mais sustentável e mais democrática. Como é nosso lema: viver melhor na nossa terra.

A nossa proposta assenta em trabalho feito, na força e energia para transformar, envolvendo todos. Não vimos para separar, mas para unir forças em prol dos lacobrigenses.

Litoralgarve – E se a CDU integrar, de novo, o próximo executivo municipal, o que poderá mudar?

Alexandre Nunes – Estou perfeitamente convencido de que a CDU apresenta uma candidatura, com pessoas e propostas de grande valor, capazes de liderar a autarquia de Lagos.

Uma vez que as próximas eleições decorrem num contexto especial, tenho confiança de que os eleitores, saberão reconhecer essa qualidade, sobretudo em eleições autárquicas, onde as pessoas conhecem os candidatos.  Neste cenário, a CDU está preparada para ser a força transformadora de que Lagos precisa. Votar nesta candidatura será um contributo enorme para que a maioria absoluta não se repita e assim garantir uma forma de governar mais plural, ouvindo mais vozes e construindo soluções mais sólidas.

“Na política, não faz sentido avaliar as pessoas, mas sim as suas propostas e o trabalho já desenvolvido.  Neste momento, desconheço as propostas concretas” dos restantes “candidatos e movimentos para o concelho”

Litoralgarve – O que pensa dos outros candidatos — Paulo Rosário Dias (Chega), Gilberto Viegas (AD), Luís Barroso (Movimento Lagos com Futuro)?

Alexandre Nunes – Na política, não faz sentido avaliar as pessoas, mas sim as suas propostas e o trabalho já desenvolvido.  Neste momento, desconheço as propostas concretas destes candidatos e movimentos para o concelho. Relativamente ao trabalho político e na sociedade já desenvolvido pelos mesmos, não posso deixar de considerar que a relevância e o impacto que a CDU tem tido reflete uma postura muito mais construtiva e benéfica para todos.

“As nossas listas combinam experiência e renovação e as populações conhecem a seriedade e o compromisso dos autarcas da CDU, com as suas responsabilidades e foco em resolver os problemas das pessoas”

“Apresentamos muitas novidades, das quais realço as quatro novas cabeças de lista às Juntas de Freguesia – (São Gonçalo, Luz, Barão de São João e Bensafrim) – todas mulheres” 

Litoralgarve – Quais são as novidades nas listas da CDU, no concelho de Lagos, para as eleições autárquicas a realizar a 12 de Outubro de 2025?

Alexandre Nunes – Apresentamos muitas novidades, das quais realço as quatro novas cabeças-de-lista às Juntas de Freguesia – (São Gonçalo, Luz, Barão de São João e Bensafrim) – todas mulheres. 

As nossas listas combinam experiência e renovação e as populações conhecem a seriedade e o compromisso dos autarcas da CDU, com as suas responsabilidades e foco em resolver os problemas das pessoas.

Trazemos a experiência acumulada, complementada por ideias novas de democratas que encontraram na CDU o espaço para a sua participação.

“Começámos o Verão com problemas por resolver: falta de ordenamento no estacionamento, especialmente nas praias, e carência de infraestruturas para mobilidade suave (pedonal e ciclável) e baixa resposta na recolha do lixo”

Litoralgarve – Como avalia este Verão em Lagos? Há mais turistas?

Alexandre Nunes – Não tenho dados que me permitam concluir que há mais ou menos. Mas não me custa acreditar que haja algum decréscimo quando o custo de vida aumenta, nomeadamente no caso dos portugueses que continuam a ter salários abaixo da média europeia. Mais um dos aspectos a que a CDU tem dedicado grande parte do seu trabalho.

Não quero deixar de referir que começámos o Verão com problemas por resolver: falta de ordenamento no estacionamento, especialmente nas praias, e carência de infraestruturas para mobilidade suave (pedonal e ciclável) e baixa resposta na recolha do lixo.

Para o aumento da população no Verão, em Lagos, “algumas infraestruturas estão dimensionadas (ETAR, rede de água), mas outras continuam insuficientes, como o trânsito, a mobilidade, a recolha de lixo ou a saúde”

Litoralgarve – Lagos está preparada para o aumento da população nesta altura do ano?

Alexandre Nunes – Algumas infraestruturas estão dimensionadas (ETAR, rede de água), mas outras continuam insuficientes, como o trânsito, a mobilidade, a recolha de lixo ou a saúde. É preciso um planeamento mais rigoroso e sustentável. Até porque se estas estruturas tiverem capacidade para lidar com o aumento de população que registamos no Verão, significa que também estarão preparadas para lidar com aumentos permanentes ao longo de todo o ano.

Litoralgarve – Que outros alertas deixa a este nível?

Alexandre Nunes – O turismo tem de ser sustentável (ambientalmente, socialmente e economicamente), caso contrário, corre o risco de destruir o que o torna atrativo. Deve servir para dinamizar os setores produtivos locais — agricultura, pesca, artesanato — e não ser apenas uma atividade sazonal.

Deve valorizar o território, criar emprego digno e gerar benefícios duradouros para quem cá vive.

Numa frase, Lagos deve apostar no turismo para melhorar a vida dos seus habitantes e não fazer essa aposta apenas para garantir que os turistas têm uma boa experiência.